Título: Um libelo pela imprensa livre, há 180 anos
Autor: Manzano, Gabriel
Fonte: O Estado de São Paulo, 30/11/2011, Nacional, p. A8

Livro de Libero Badaró já dizia em 1829: mesmo o abuso da imprensa não justifica o seu controle

Em tempos de censura judicial explícita e de campanhas pelo "controle social da mídia", a editora Migalhas voltou no tempo, por quase dois séculos, e trouxe um atualíssimo recado contra essas ameaças: o pequeno volume Liberdade de Imprensa, escrito em 1830 por Líbero Badaró.

Culto, corajoso, irreverente, criador e faz-tudo do jornal Observador Constitucional, Badaró deixou à história uma frase célebre ao morrer baleado por um adversário político, em novembro de 1830: "Morre um liberal, mas não morre a liberdade!" O livrinho, na verdade um artigo de cerca de 30 páginas, é um grito à altura de sua despedida.

Tão antigo, pelos parâmetros correntes, e tão atual, pelo conteúdo, o texto era uma insuportável provocação aos ouvidos de D. Pedro I, imperador autoritário e incapaz de submeter-se à Constituição de 1824 - que ele próprio outorgou, depois de rasgar a do Parlamento. Por exemplo, ao perguntar: "Se não é a liberdade de imprensa, que faça chegar ao ouvido dos imperantes os gemidos dos oprimidos, quem o fará?"

Ou, mais adiante, nesta constatação: "Temos lido (...) que as declarações da imprensa liberal estorvavam a marcha do ministério. Não duvidamos que seja verdade e damos por isso sinceros parabéns ao Brasil." Como bem lembra a introdução, "seu alvo era o absolutismo, sua meta a liberdade. Nada mais universal".

Numa didática introdução, o advogado Manuel Alceu Affonso Ferreira - consultor do Estado e habituado a digladiar com censores - faz a inevitável ponte entre aquele Brasil que engatinhava e o de hoje, já em sua sexta Constituição. Por mais clara que seja a atual Carta, diz ele, "não vêm sendo raros os exemplos de jornais judicialmente apreendidos". E a lei eleitoral "continua proibindo às rádios e televisões que, durante as campanhas, emitam opiniões a respeito de candidatos e partidos". Ou seja, não só de imperadores vive o arbítrio.

Em capa dura e belo acabamento, Liberdade de Imprensa é um lembrete para quem entende que ela deve ser vigiada. Com tão bem definiu Badaró há 182 anos. "um governo que quer o bem dos cidadãos não tem o que temer dela."