Título: Contra sanções, estudantes radicais invadem embaixada britânica no Irã
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Fonte: O Estado de São Paulo, 30/11/2011, Internacional, p. A10

Cerca de 300 jovens ativistas ligados à linha dura do regime ocupam missão diplomática em Teerã, depredam instalações, tomam documentos sigilosos e incendeiam veículo; ONU condena ataque e Londres promete 'sérias consequências'

Centenas de manifestantes invadiram e depredaram ontem a embaixada da Grã-Bretanha no Irã, um dia após o Parlamento ter aprovado a expulsão do embaixador de Londres em Teerã. A TV estatal iraniana transmitiu ao vivo o ataque à missão diplomática, com documentos sendo atirados pelas janelas e jovens pulando os muros do complexo - cenas que lembraram a histórica tomada da embaixada dos EUA em Teerã, em 1980.

Após informações contraditórias na imprensa iraniana, o Foreign Office (chancelaria britânica) desmentiu a notícia de que funcionários da embaixada teriam sido feitos reféns. Tampouco houve diplomatas feridos, segundo o secretário do Exterior William Hague.

Visivelmente irritado, o primeiro-ministro David Cameron condenou o ataque e acusou o Irã de violar a Convenção de Viena, que obriga Estados a garantir a inviolabilidade das missões diplomáticas e a segurança dos funcionários estrangeiros. Segundo ele, o ataque foi "revoltante e indefensável", e o Irã enfrentará "sérias consequências" por sua "inaceitável omissão".

O grupo que entrou na embaixada era formado por estudantes ligados à linha-dura do regime. Eles se reuniram diante do prédio às 10 horas, conseguiram pular os muros e arrebentaram portões, aos gritos de "Morte à Grã-Bretanha".

Um automóvel do corpo diplomático foi incendiado com coquetéis molotov, enquanto janelas eram estilhaçadas com pedras. Manifestantes escalaram o estandarte onde estava a bandeira britânica, que foi arrancada e substituída pela iraniana. Imagens da rainha Elizabeth II também foram levadas pela multidão. Do lado de fora, estudantes erguiam fotos do líder supremo do Irã, Ali Khamenei, e de cientistas nucleares misteriosamente assassinados - ataques atribuídos a Israel, EUA e potências europeias.

As informações sobre o comportamento da polícia diante do ataque dos manifestantes ainda são contraditórias. Alguns veículos da imprensa iraniana noticiaram choques entre os estudantes e soldados. Mas testemunhas, incluindo funcionários da embaixada, disseram que a polícia acompanhou de longe a ação.

A agência Mehr, controlada pela República Islâmica, noticiou ainda que a residência do embaixador britânico teria sido atacada. Londres não confirmou a informação. À noite, a polícia já havia retirado os manifestantes da embaixada.

Tensão crescente. Reunido em Nova York, o Conselho de Segurança da ONU aprovou ontem por consenso uma condenação ao ataque à embaixada britânica. Falando a jornalistas na Casa Branca, o presidente Barack Obama exortou o Irã a levar os responsáveis pelo ataque à Justiça imediatamente.

O clima entre britânicos e iranianos deteriorou-se rapidamente nos últimos dias. Na segunda-feira, o Parlamento iraniano decidiu retaliar a decisão da Grã-Bretanha de impor novas sanções contra o programa nuclear iraniano. O órgão legislativo determinou a expulsão do embaixador britânico em Teerã, Dominick Chilcott, e o rebaixamento das relações bilaterais para o nível de encarregado de negócios.

No mesmo dia, o líder supremo do Irã afirmou que a Grã-Bretanha representa a arrogância do imperialismo ocidental "e tem um histórico de humilhação de outras nações, destruindo culturas e civilizações para tomar controle de seus recursos".

O deputado Mehdi Kuchakzadeh havia ameaçado no domingo a Grã-Bretanha, fazendo alusões ao cerco de 1980 à embaixada americana. "O governo britânico deve entender que, se insistir em suas posições diabólicas, o povo iraniano o golpeará na boca - exatamente como ocorreu com o ninho de espiões americanos em Teerã."

Desde 1979, as relações entre britânicos e iranianos têm sido marcadas pela tensão. Além das ameaças mútuas, os dois países chegaram a romper laços depois que o líder supremo de Teerã emitiu uma fatwa (condenação à morte) contra o escritor indiano-britânico Salman Rushdie, em 1988. / REUTERS