Título: Mini Vale do Silício cresce em Londres
Autor: Mark Scott,
Fonte: O Estado de São Paulo, 10/12/2011, Economia, p. B30

Zona leste londrina tem atraído empresas de tecnologia que recebem incentivos do governo

Quando a Eventbrite, empresa iniciante de San Francisco dedicada à venda de ingressos pela internet, decidiu abrir o primeiro escritório no exterior, os fundadores miraram East End, em Londres.

A capital britânica oferecia uma grande força de trabalho composta por jovens poliglotas formados no ensino superior e fácil acesso aos mercados na Ásia e na América do Norte. Em outubro, a empresa de tecnologia se instalou em uma antiga joalheria em Saffron Hill, distrito que era conhecido pela criminalidade no século 19. "Londres será nossa central europeia, o ponto a partir do qual começaremos nossa expansão para o restante do continente", disse Renaud Visage, cofundador da Eventbrite que divide seu tempo entre os arredores de San Francisco, Londres e Paris.

Antes uma área mal cuidada, a zona leste de Londres emergiu como uma versão em miniatura do Vale do Silício, atraindo centenas de empresas iniciantes nas áreas de tecnologia e novas mídias. Botecos acabados e espeluncas deram lugar a cafés badalados que servem macchiatos de US$ 6 à descolada clientela de pouco mais de 20 anos. Pubs da região estão agora acumulando estoques de cerveja das melhores microcervejarias europeias. Em meio à revitalização, o preço do metro quadrado aumentou até 50% em certos edifícios.

"Todas as startups da região estão constituindo uma pequena comunidade", disse Paul Brine, diretor de marketing do site FarFetch, que oferece uma loja eletrônica para os produtos de butiques da alta moda nos EUA e na Europa. A indústria local está recebendo ajuda do governo britânico. No ano passado, o primeiro-ministro David Cameron anunciou a criação de um fundo de investimento de US$ 23 milhões para atrair empreendedores tecnológicos à zona leste de Londres, região chamada pelo governo de Tech City.

Os representantes do governo também criaram uma categoria especial de visto voltada para a aceitação rápida de não europeus interessados em abrir empresas na Grã-Bretanha, e anunciaram US$ 312 milhões em financiamento de capital próprio para as empresas britânicas de tecnologia que apresentassem o crescimento mais rápido.

"Nosso papel é garantir que a infraestrutura necessária ao crescimento do setor tecnológico esteja no lugar", disse Eric Van Der Kleij, o "empreendedor residente" do governo britânico encarregado de supervisionar a Organização de Investimento de Tech City, sustentada pelo Estado. "Meu objetivo é determinar uma data de fechamento para a nossa organização, pois o setor privado está apresentando um desempenho excelente." A estratégia do governo começa a dar resultados. As empresas sediadas em Londres atraíram US$ 433 milhões em capital de investimento nos primeiros nove meses de 2011, de acordo com os dados da Dow Jones VentureSource. Trata-se de um aumento de 25% em relação ao mesmo período do ano anterior, e também da maior quantia captada desde o início da recente recessão.

A cidade também está diminuindo a diferença que a separa do polo de empresas iniciantes mais bem estabelecido do país, Cambridge, que investiu na sua universidade para obter um grande número de empresas tecnológicas de sucesso como a desenvolvedora de chips ARM Holdings e a desenvolvedora de software empresarial Autonomy.

"Os investidores americanos estão prestando cada vez mais atenção naquilo que está ocorrendo em Londres", disse David Hornik, sócio da August Capital, firma de capital de investimento do Vale do Silício, numa recente visita à Grã-Bretanha. "É grande o interesse das empresas daqui em receber os recursos de fundos de capital de investimento estabelecidos nos EUA." Os grandes nomes do Vale do Silício também estão pensando na zona leste de Londres. Em setembro, o Google anunciou planos para a abertura de um escritório de sete andares no coração da região. A empresa vai usar o local para oferecer workshops, exibir novos produtos e proporcionar espaço para organizações que apoiem as empresas iniciantes da região. A Intel está construindo um laboratório de pesquisa em informática, e a Cisco Systems prometeu investir US$ 500 milhões nos próximos cinco anos, incluindo a construção de um centro de inovação no local dos Jogos Olímpicos de 2012.

Apesar da vibrante comunidade de empresas iniciantes em Londres, a cidade carece de muitos elementos básicos que ajudam a estimular a atividade empreendedora. Brine, da FarFetch, disse que a empresa teve de implorar para encerrar seu contrato de aluguel quando suas atividades passaram a exigir um espaço maior do que o armazém atual. O site Bullseyehub, que ajuda os organizadores de eventos a promovê-los na rede, enfrentou dificuldades na sua busca por desenvolvedores e engenheiros qualificados em Londres por causa do crescimento da sua equipe, que passou de cinco funcionários para mais de 28 num intervalo inferior a um ano. Para suprir a demanda, eles tiveram de recrutar um gerente de produto do Vale do Silício com experiência na ampliação de pequenas empresas de tecnologia.

"Londres é um ótimo lugar para se administrar uma empresa, mas existe uma escassez de profissionais que tenham participado de empresas iniciantes bem sucedidas", disse Alex Will, 28 anos, fundador da empresa cuja renda supera hoje a marca de US$ 1,5 milhão.

A infraestrutura tecnológica britânica pode ser outro fator que sufoca o crescimento da zona leste de Londres. O país ocupa a 25.ª posição no ranking internacional de largura de banda de acesso à internet, segundo a Akamai, empresa de infraestrutura da internet. Isso deixa a Grã-Bretanha - dona da sexta maior economia do mundo - atrás de países como Romênia e Letônia. E, apesar de o novo visto especial para empreendedores ter ajudado a atrair profissionais a Londres, o sistema pode ser inflexível demais para seduzir os mais talentosos, segundo a Reshma Sohoni, americana sócia da Seedcamp, firma de investimento de financia empresas iniciantes. / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL