Título: China vai surpreender os mercados, diz especialista
Autor: Dantas, Fernando
Fonte: O Estado de São Paulo, 28/01/2012, Economia, p. B9

Em debate sobre o futuro do país, Stephen Roach, do Morgan Stanley, estava mais otimista que chineses

Os mercados vão se surpreender com a China, disse ontem o economista Stephen Roach, do banco de investimentos Morgan Stanley, e grande especialista no país asiático.

Em debate sobre o futuro da China no Fórum Econômico Mundial, em Davos, ele observou que o mercado acionário chinês foi um dos que tiveram pior desempenho recentemente, com os investidores assustados com a ideia de que a China "é uma enorme bolha residencial a ponto de estourar". Para Roach, o nervosismo sobre o desempenho da China baseia-se em noções equivocadas. "Estou enormemente otimista em relação à China", ele disse.

Na visão do economista, que esteve baseado vários anos na China, as autoridades econômicas do país asiático provaram ao longo de 30 anos que são extremamente capazes de gerenciar eficientemente diferentes conjunturas econômicas. Para ele, o 12.º plano quinquenal da China, lançado em 2011, delineia a estratégia certa para enfrentar os atuais desafios econômicos do país.

"A China é um país que tem estratégia, num momento em que muitos países até se esqueceram como se soletra a palavra estratégia, e aí eu incluo o meu", disse Roach, que é americano. Para o economista, a ideia de que haja uma oferta excessiva de imóveis na China, com histórias de "cidades fantasmas", sem habitantes, deve-se ao fato de que, com uma migração de 15 a 20 milhões de pessoas por ano para os centros urbanos, há uma antecipação da construção de residências. Ele relatou que uma das "cidades fantasmas" transformou-se numa área altissimamente povoada de Xangai.

Ressalvas. Curiosamente, na mesa de debates, Roach, o único ocidental, foi o que se revelou mais entusiasticamente otimista sobre o país. Os outros painelistas também apresentaram visões basicamente favoráveis, mas com ressalvas, como os altíssimos preços das residências nas áreas mais valorizadas do país.

Deng Yongheng, professor do Instituto de Estudos Imobiliários da Universidade Nacional de Cingapura observou que os preços residenciais em Xangai estão tão caros que impedem que estudantes de outras regiões estudem nas universidade da metrópole, que estão entre as melhores da China. Roach retrucou: "E você acha que algum estudante acha fácil morar em Nova York?".

Para o economista do Morgan Stanley, os três grandes desafios da economia chinesa, que são abordados pelo 12.º Plano Quinquenal, são o de fazer a transição de um modelo baseado em exportações e investimentos para um modelo baseado em consumo; gerir o processo de urbanização crescente atrelado à expansão da renda; e criar uma rede de proteção social, massificando benefícios como aposentadoria e seguro-desemprego.

Roach considera que os maiores riscos para a estratégia chinesa estão justamente naquele último item, já que o governo vem ampliando direitos mas não está alocando recursos suficientes em benefícios sociais. Assim, não está sendo rompida a estrutura de incentivos na raiz do excesso de poupança das famílias chinesas, que buscam garantir a manutenção dos padrões de consumo na velhice e custear o estudo dos filhos.

Sistema financeiro. Outro entrave no aumento do consumo chinês, para o economista, é o a chamada "repressão financeira" - - a diferença artificialmente elevada entre as taxas de juros para empréstimo e para aplicações (que são muito menores). Uma simples normalização do sistema financeiro chinês, na avaliação de Roach, poderia provocar um salto imediato do consumo de grande proporção.

Durante o debate, Li Daouki, diretor do Centro China na Economia Mundial, um think-tank chinês, observou que as mudanças na China de hoje derivam - muito mais do que os ocidentais imaginam - de pressões populares, "de baixo para cima e não de cima para baixo", especialmente provenientes da internet. Segundo Li Daokui, o fator que em última instância levará a economia chinesa a um novo equilíbrio mais baseado no consumo e o aumento da renda, que hoje se dá numa velocidade superior à expansão do Produto Interno Bruto (PIB).

Em relação à política cambial, Daouki disse que a recente valorização do renminbi (yuan), no mesmo momento em que muitas moedas se desvalorizaram em comparação ao dólar, indica que a moeda chinesa está perto do equilíbrio. Um executivo brasileiro presente ao debate confidenciou que teve de conter uma gargalhada quando ouviu esse comentário de Daouki.