Título: Cuba proíbe blogueira de deixar a ilha
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Fonte: O Estado de São Paulo, 04/02/2012, Internacional, p. A20

Yoani Sánchez queria vir ao Brasil para lançamento de filme; colunista do "Estado" diz que esta é a 19ª vez que Havana nega sua saída

A blogueira cubana e colunista do "Estado" Yoani Sánchez anunciou ontem que o governo de seu país negou a autorização de saída que ela havia pedido para vir ao Brasil. A intenção da "jornalista independente" era acompanhar o lançamento de um documentário sobre direitos humanos - gravado em Cuba e em Honduras - em que ela é entrevistada. O lançamento do filme está marcado para o dia 10, em Jequié, na Bahia.

"Se todo esse esforço serviu para jogar luz sobre o absurdo migratório em que estamos presos, então valeu a pena", tuitou a cubana. No dia 25, o Ministério das Relações Exteriores brasileiro anunciou que havia concedido um visto para Yoani visitar o País. Para o Estado cubano, porém, essas autorizações de entrada não são suficientes para garantir que seus cidadãos deixem a ilha. Uma licença do governo é necessária.

A autora do blog Generación Y afirma que foi a 19.ª vez que ela teve a permissão de saída - conhecida como "carta branca" pelos cubanos - negada pelo regime de Havana. "Meu passaporte está cheio de vistos, mas nunca consegui deixar a ilha", disse Yoani ao Estado no dia 27, quando entregou ao governo os documentos necessários para a emissão da licença. "Raúl Castro está de viagem na Venezuela, mas não me deixam visitar o Brasil. Coisas de totalitarismos", tuitou ontem a cubana, citando o perfil da presidente Dilma Rousseff no microblog.

Yoani havia escrito uma carta à presidente brasileira, pedindo que ela intercedesse a favor de sua saída quando se encontrasse com as autoridades da ilha. A blogueira tentou ainda se encontrar com Dilma para falar justamente sobre a dificuldade dos cubanos em deixar o país.

A presidente, porém, se recusou a recebê-la - assim como a outros opositores cubanos - durante a visita que fez à ilha no início da semana. "O Brasil deu o visto para a blogueira, mas os demais passos (para que a dissidente visite o País) não são da competência do governo brasileiro", afirmou a presidente em Havana, ao ser questionada sobre o caso.

"Sinto-me como uma refém sequestrada por alguém que não dá explicações. Um governo encapuzado e com pistola na cinta", escreveu Yoani. Na opinião da blogueira, os governantes cubanos "não aprendem". "Se me deixam sair (do país) eles perdem. Se não me deixam sair, perdem mais."

Uma reforma da política migratória, reivindicada pela blogueira e por vários outros dissidentes, é uma das promessas do governo cubano, que, desde o fim de 2010, põe em prática mudanças socioeconômicas na ilha.

"De que vale que tenhamos um porto tão grande e moderno como o de Mariel (cuja construção, feita pela Odebrecht e financiada pelo governo brasileiro) se não podemos sair (de Cuba) por ele?", questionou Yoani em sua página no Twitter.

Nos tuítes que publicou antes de receber a negativa de Havana, a blogueira mostrava expectativa e até esperança de que conseguiria a autorização para vir ao Brasil. "Minha cela não está rodeada de concreto e metal, mas de água. Minha prisão é efêmera, ridícula, passageira. Algum dia conseguirei!".

Depois da resposta de Havana, porém, ela expressou sua decepção. "Não há surpresas. Voltam a me negar a permissão de saída. É a 19.ª vez que violam meu direito de entrar e sair de meu país." / REUTERS, EFE e AP

Para lembrar

Dilma evitou os dissidentes

Antes da viagem da presidente Dilma Rousseff a Cuba, no início da semana, o Itamaraty avisava: a brasileira não falaria com dissidentes durante a visita. Ao ser questionada a respeito de Yoani Sánchez, em Havana, a presidente disse que "o Brasil deu o visto para a blogueira", afirmando que os outros passos necessários para sua saída não eram da "competência do governo brasileiro". Dilma declarou que a questão dos direitos humanos não pode se tornar "uma arma de combate político-ideológico". "Se vamos falar de direitos humanos, começaremos a falar de direitos humanos no Brasil, nos EUA, a respeito de uma base aqui chamada Guantánamo", disse.