Título: Fazenda e Banco Central são interdependentes
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 04/02/2012, Economia, p. B2

O Ministério da Fazenda e o Banco Central (BC) andam de mãos dadas. Mas essa interdependência pode levar a sérias dificuldades, se uma das instituições não conseguir alcançar metas que ambas escolheram como hipótese de trabalho. Ora, algumas das hipóteses que formulam parecem frágeis nesta fase da economia.

Na última Ata da Reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), constava que "o Copom "atribui" elevada probabilidade à concretização de um cenário que contempla a taxa Selic se deslocando para patamares de um dígito". Após a publicação do documento, o presidente do BC teve oportunidade de reforçar essa perspectiva. No entanto, na visão otimista do BC, a hipótese básica é de que seja atingido um superávit de R$ 139,8 bilhões nas contas públicas.

De um lado, o Ministério da Fazenda, em colaboração com o do Planejamento, prepara um programa visando ao contingenciamento orçamentário de R$ 60 bilhões, que se considera plenamente factível, desde que o Copom reduza progressivamente a taxa Selic. Como se vê, o BC depende do plano econômico da Fazenda, enquanto esta depende do BC para dosar a taxa de juros básica.

Não se pode negar que, além dessa interdependência, os rumos dos dois organismos dependem da concretização de outros fatores, o que mostra a fragilidade das expectativas.

O BC parece muito audacioso ao deixar entrever que até o final do ano chegará a uma Selic de um dígito - o que leva a pensar que sua meta não é mais 4,5% para a inflação e que não ficará horrorizado se a inflação ficar só dentro do limite superior do IPCA. Assim, a meta central é esquecida e uma atitude frouxa pode reservar muitas surpresas desagradáveis no controle da inflação.

Se é verdade que o governo conseguiu ultrapassar a meta do superávit primário no ano passado, não podemos deixar de levar em conta as condições em que conseguiu a proeza. Na verdade, aproveitou-se de uma arrecadação excepcionalmente alta, situação que não deve se repetir em 2012; forçou as empresas estatais a pagar dividendos elevados; e, além de tudo, investiu bem menos do que no ano anterior.

Como agora, no seu planejamento, volta a dar prioridade a obras de infraestrutura, só com um corte muito significativo dos gastos da administração é que poderá cumprir sua meta do superávit primário. Temos de acrescentar que qualquer desvio nas suas projeções - PIB de 3,5% ou inflação maior do que a prevista em razão da taxa cambial - põe em xeque suas pretensões. Ficamos, assim, mais no domínio das boa intenções.