Título: Déficit não é preocupante, diz ex-ministro
Autor: Silva, Cleide ; Gazzoni, Marina
Fonte: O Estado de São Paulo, 04/02/2012, Economia, p. B3

Miguel Jorge prevê um enorme problema em troca de poucos resultados com o México

O ex-ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Miguel Jorge, acredita que o governo brasileiro vai criar um problema enorme em troca de poucos resultados se fizer mudanças drásticas no acordo automotivo com o México. Hoje sócio de uma consultoria, ele diz que o déficit de US$ 1,5 bilhão na balança automotiva em 2011 não é preocupante. "O governo deveria se ater mais ao saldo negativo de setores como eletroeletrônicos e químicos".

Desde 2002, quando o acordo foi firmado, inicialmente com cotas, o País foi superavitário na balança bilateral de veículos até 2007, com saldo total de US$ 6,5 bilhões. A posição inverteu-se em 2008 e, desde então, o déficit acumulado é de US$ 2,7 bilhões.

Em unidades, cerca de 1,5 milhão de carros brasileiros foram exportados para o México. De lá, vieram 475 mil automóveis, segundo a Secretaria de Comércio Exterior (Secex) e da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea).

Para o especialista em Direito do Comércio Exterior, Alexandre Lira, a ideia de rever o acordo segue a mesma lógica do aumento de 30 pontos porcentuais do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) para os importados. "A intenção é pressionar as montadoras a produzirem no Brasil em vez de importar, mas o tiro pode sair pela culatra".

As montadoras estão escolhendo o México para novos investimentos porque, além de abastecer os Estados Unidos, podem fornecer para o Brasil. Esse pode ser um dos fatores que também preocupa o governo.

No mês passado, a Nissan anunciou que vai construir uma terceira fábrica no México, com investimento de US$ 2 bilhões (R$ 3,6 bilhões). A marca, que também terá nova unidade no Rio, em 2014 (ao custo de R$ 2,6 bilhões), importa quatro modelos: March, Versa, Tiida e Sentra.

A GM - que importa o Captiva -, vai produzir no país o compacto Sonic, recém lançado nos EUA, que será exportado para o Brasil. Há estudos da Audi em abrir uma fábrica no México e também da Mercedes-Benz. Recentemente, o presidente mundial da Mercedes, Dieter Zetsche, manifestou descontentamento com a alta do IPI. "Não estamos felizes com essas decisões, pois elas não ajudam no desenvolvimento dos mercados".

A Ford traz do México o novo Fiesta e o Fusion, enquanto a Fiat traz o 500 e o Freemont. A Volkswagen importa o Jetta, a Chrysler o Dodge Journey e a Honda o CR-V. Com exceção do March e do Versa, que custam a partir de R$ 27,8 e R$ 35,4 mil, os demais têm preços acima de R$ 40 mil. Do Brasil, a maioria dos modelos exportados é de compactos, mais baratos. "Se as montadoras puderem escolher entre produzir no México ou no Brasil, vão para lá por conta do câmbio", diz um consultor.

Para o executivo de uma das grandes montadoras, a forma como o assunto está sendo tratado "é para pressionar os mexicanos". O governo tentou várias vezes ampliar o acordo bilateral para outros setores, sem sucesso.

As montadoras admitem que o acordo é desfavorável ao Brasil porque a regra permite 35% de peças regionais para o carro mexicano, enquanto para o carro do Mercosul é 65%. Muitas peças usadas por fábricas mexicanas vêm dos EUA. Entre as medidas que poderiam ser adotadas estão a adoção de cotas, índice de regionalização similar ao do Mercosul ou cobrar IPI maior dos carros mexicanos.