Título: Fim da era do Japão?
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Fonte: O Estado de São Paulo, 09/01/2012, Notas e informações, p. A3

O provável déficit da balança comercial do Japão em 2011 (os dados finais serão conhecidos na segunda quinzena de janeiro), o primeiro em várias décadas, pode marcar o fim de uma longa era caracterizada pela crescente presença de produtos de consumo japoneses nos grandes mercados mundiais e pelo prestígio desses produtos entre os consumidores. Se houver novos déficits comerciais, em pouco tempo o Japão não apenas terá perdido para a China a condição de segunda maior economia do planeta, como deixará de ser referência mundial na produção e exportação de itens essenciais do mundo contemporâneo, sobretudo os bens de alta tecnologia.

Só dentro de algum tempo se terá ou não a confirmação do declínio da economia japonesa. De imediato, o que os resultados mensais negativos do comércio exterior mostram é um país ainda às voltas com dificuldades provocadas por desastres naturais - inesperadas, de extensão e gravidade poucas vezes vistas na história e, por isso mesmo, de difícil superação -, mas também governado por políticos que, até agora, não demonstraram competência para resolver velhos problemas econômicos, que se agravaram com a crise global. A persistência das dificuldades do Japão torna ainda mais difícil a superação da crise internacional.

As exportações japonesas foram duramente afetadas pelo terremoto de 11 de março do ano passado, seguido de um tsunami de efeito devastador para a região Nordeste do país. Diversos setores da indústria tiveram de interromper suas atividades porque não dispunham de componentes fornecidos por empresas instaladas na região devastada.

A deterioração das condições econômicas da Europa ampliou as dificuldades para as vendas externas do Japão. Depois, as inundações na Tailândia, para onde muitas empresas exportadoras japonesas transferiram diversas unidades de produção - que se tornaram importadoras de componentes produzidos no Japão -, reduziram ainda mais as exportações.

Por fim, a valorização do iene - de 7% desde maio, em média, em relação às principais moedas, como o dólar e o euro - reduziu a competitividade do produto japonês.

A combinação desses problemas tem levado grandes corporações a transferir a produção para outros países da Ásia, o que contribui para deteriorar a base industrial do país, que sustentou o crescimento desde o início da década de 1950, e para reduzir a oferta de emprego para os jovens que chegam ao mercado de trabalho.

Graças aos superávits que acumulou nos últimos anos, o Japão dispõe de muitos ativos no exterior. Suas empresas também investiram em outros países. É provável que o rendimento desses ativos compense o déficit da balança comercial, de modo que o balanço de pagamentos do país se mantenha equilibrado. Mas o acúmulo de problemas internos não resolvidos, e que tendem a se agravar - como o do aumento da idade média da população, que deverá reduzir a capacidade de poupança do país -, tornam cada vez mais incerto o futuro.

Como já dissemos, o sistema político japonês tem sido incapaz de responder aos desafios. O fato de o atual primeiro-ministro, Yoshihiko Noda, ser o sétimo a ocupar o cargo nos últimos cinco anos, mostra a dificuldade dos políticos para apresentar e colocar em prática planos duradouros que mereçam apoio popular. A queda do prestígio de Noda desde sua posse, em setembro, mostra que também sua passagem pelo posto não deverá ser longa.

Sem conseguir dar respostas satisfatórias à população cada vez mais preocupada com as reais condições da usina nuclear de Fukushima, duramente atingida pelo tsunami de março, o governo, independentemente de quem ocupe sua chefia, continua a patinar na questão fiscal.

O que de mais importante o governo japonês pode fazer no momento é restabelecer a confiança na política fiscal, pois, entre os países mais ricos do mundo, o Japão é o que tem as finanças públicas em pior situação. Mas, como seus últimos antecessores, Noda não tem demonstrado capacidade para enfrentar adequadamente esse problema.