Título: Revés na economia atrapalha chavismo
Autor: Sant"Anna, Lourival
Fonte: O Estado de São Paulo, 12/02/2012, Internacional, p. A12/13

O presidente Hugo Chávez enfrenta as urnas em outubro com uma inflação galopante - 27% ao ano, a mais alta das Américas -, escassez de produtos como leite, carne e óleo vegetal e o desgaste natural de 13 anos de governo. Em compensação, tem a seu lado o barril de petróleo a US$ 111 e um Estado hiperinflado, que paga a 6 milhões de venezuelanos salários ou bolsas das inúmeras "missões" criadas por seu governo. Numa população de 29 milhões, significa dizer que boa parte das famílias é sustentada pelo Estado.

A iniciativa privada diminuiu muito de tamanho, perdendo capacidade de empregar. Em 1999, havia 14 mil indústrias na Venezuela. Hoje, são pouco mais de 7 mil. O índice oficial de desemprego é de 8%, mas quase metade dos trabalhadores não tem carteira assinada. De maneira que o Estado é o grande empregador.

A receita do petróleo tem sido parcialmente drenada pelo fornecimento, a preços muito abaixo do mercado, aos países aliados, como Cuba. Um contrato com a China prevê a venda do barril a 80% de seu preço de mercado. Em troca, a China já emprestou US$ 34 bilhões à Venezuela, e fornece eletrodomésticos, vendidos a preços subsidiados para os funcionários públicos e participantes dos programas sociais do governo.

Sem conseguir fazer face aos gastos públicos crescentes, o país já atingiu um endividamento de US$ 150 bilhões - 52% do PIB -, que é sustentado com juros de 14%, também os mais altos do Hemisfério. "É uma política perversa, que leva o capital para fora do país", diz José Guerra, economista-chefe do Banco Central entre 2003 e 2005.

Esses problemas econômicos não têm tido grande impacto sobre a vida dos mais pobres. As importações de alimentos e de outros produtos essenciais são subsidiadas por um dólar a 4,30 bolívares, quando no mercado livre a moeda americana ultrapassa os 8 bolívares. Visando a eleição presidencial deste ano, Chávez lançou a Missão Moradia, que distribui casas aos pobres.

O artifício já tinha sido usado em 2003, quando as pesquisas indicavam a derrota de Chávez no referendo sobre sua permanência no cargo, recorda o cientista político Herbert Koeneke. O presidente criou as "missões", com apoio de Cuba, que enviou médicos e dentistas, adiou o referendo por um ano e o venceu. "Chávez é um grande vendedor de esperanças", observa o economista Teodoro Petkoff, diretor do jornal Tal Cual, de oposição.

Mas a popularidade do presidente enfrenta problemas, como a alta criminalidade, que, segundo o cientista político Carlos Romero, está relacionada com dois outros pontos vulneráveis do governo: a corrupção e a ineficiência administrativa, que afetam também a polícia. A infra-estrutura do país está em mau estadoe a frota de veículos, sucatada por causa do alto preço dos importados. Mas os admiradores de Chávez não costumam responsabiliza-lo pelos problemas do país. Em outubro se verá se o carisma de Chávez e a capacidade do Estado provedor continuam mais fortes do que esses problemas.

Uma outra questão é a de saber se Chávez aceitaria uma derrota eleitoral. Koeneke chama a atenção para a declaração de Chávez, na celebração do 20° aniversário da tentativa de golpe militar, na qual se tornou famoso, em 4 de fevereiro de 1992: "As Forças Armadas são chavistas." Para o analista, foi uma insinuação de que os militares poderiam defender seu regime contra uma vitória da oposição.

Além disso, de acordo com Romero, pairam dúvidas sobre a isenção do Conselho Nacional Eleitoral e sobre a lisura da votação. Mas tudo dependerá da capacidade de mobilização da oposição: "Se em cada mesa houver um representante da oposição, acho muito difícil que haja fraude nessa eleição", prevê.

O desafio da oposição é mostrar-se como uma alternativa eleitoralmente viável a seu poderoso rival. / L.S.