Título: Nobel da Paz, Mãe Suu amplia campanha
Autor: Trevisan, Claúdia
Fonte: O Estado de São Paulo, 12/02/2012, Internacional, p. A16/17

Aung San Suu Kyi teve duas vidas, cuja linha divisória são os protestos pró-democracia que chacoalharam Mianmar em 1988 e a arrancaram do confortável ambiente familiar que tinha na Grã-Bretanha para transformá-la na principal líder de oposição no país.

Filha de Aung San, o herói da vitória do país sobre o colonialismo britânico, Suu Kyi estava no exterior havia mais de duas décadas quando voltou a Mianmar em março de 1988 para cuidar da mãe, Khin Kyi, que havia sofrido um derrame. Tinha 42 anos, estava casada com o britânico Michael Aris e tinha dois filhos, Alexander e Kim.

Sua presença na então capital Rangum coincidiu com a ocupação das ruas da cidade por milhares de estudantes, monges e ativistas que exigiam a democratização do país. A pedido dos manifestantes, ela fez discursos de apoio ao movimento - o que se revelou um caminho sem volta. Em setembro daquele ano, ela ajudou a fundar e se tornou secretária-geral da Liga Nacional pela Democracia (LND), que no ano seguinte lançou candidatos para as eleições gerais convocadas pelo regime militar.

O preço de seu engajamento foi alto: Suu Kyi foi colocada em prisão domiciliar em 1989 e ficou confinada na casa que era dos seus pais em 15 dos últimos 20 anos, período no qual viu o marido e os filhos em raros momentos. Seu último encontro com Aris ocorreu em 1995, quatro anos antes de ele morrer vítima de câncer de próstata. Em 1991, Suu Kyi ganhou o Prêmio Nobel da Paz, o que fortaleceu sua projeção internacional. Presa, ela foi representada na cerimônia de premiação por seus dois filhos.

A proeminência de seu pai, os sacrifícios pessoais e sua recusa em deixar Mianmar - com o temor de não conseguir voltar -, deram a ela uma aura de semideusa aos olhos da população.

Multidões acompanharam as visitas que realizou a duas regiões do país desde o início do ano, carregando cartazes ou usando camisetas com sua imagem. Para a maioria, era a primeira vez que viam Suu Kyi ao vivo.

"Eu espero que um dia ela seja a líder do país", disse Minzin, um comerciante de 37 anos que assistiu ao comício que a candidata realizou terça-feira em Pathein. Minzin vestia uma camiseta que trazia as palavras em inglês "nós amamos mãe Suu" na frente e "livre do medo" atrás. Os amigos Min Htut Twin, de 31 anos, e Hyo Zaw Shwe, de 30 anos, viajaram duas horas de barco até Pathein para ver e ouvir Suu Kyi. "Ela sacrificou seu interesse próprio em favor do povo, por isso nós temos de apoiá-la", afirmou Htut Twin.

A mesma unanimidade não é encontrada nos outros grupos de oposição, para os quais Suu Kyi é personalista, arrogante e incapaz de agregar as vozes dissidentes. As legendas que participaram da eleição de 2010 afirmam que a LND cometeu um erro ao boicotar a disputa, evidenciado pelo fato de o partido ter agora decidido apresentar candidatos para as vagas abertas no ano passado. / C. T.