Título: País quer se livrar de duras sanções
Autor: Trevisan, Claúdia
Fonte: O Estado de São Paulo, 12/02/2012, Internacional, p. A16/17

Com economia destruída, chip de celular custa US$ 625 em Rangum

É impossível usar cartões de crédito em Mianmar, onde remessas bancárias do exterior são inviáveis e um chip de celular custa o equivalente a US$ 625, preço que não inclui o aparelho. Os que desejam internet devem desembolsar de US$ 800 a US$ 1.000 só para a instalação de uma conexão lenta e sujeita a constantes quedas. A instabilidade também castiga o setor de voos domésticos, que podem mudar sem aviso prévio e cuja disponibilidade só é conhecida às vésperas do embarque.

Parte dos problemas são decorrentes das sanções econômicas adotas por EUA e Europa a partir dos anos 90, mas a má gestão oficial contribuiu para o modo disfuncional no qual o país opera, avalia Susanne Kempel, consultora em desenvolvimento que vive há cinco anos em Mianmar.

Em retribuição à onda reformista dos últimos 12 meses, a secretária de Estado americana, Hillary Clinton, visitou o país em dezembro e Washington levantou sanções que impediam cooperação técnica do Fundo Monetário Internacional e do Banco Mundial. Seguem em vigor as pesadas restrições que vetam operações financeiras, investimentos e importação de produtos do país, adotadas com o objetivo de forçar a libertação de presos políticos e a adoção de reformas democráticas.

Como os EUA continuam a ser o centro financeiro global, as sanções impedem que grande parte das outras nações faça transações bancárias com o país. As representações diplomáticas em Rangum recebem recursos em contas abertas na Tailândia. O dinheiro é sacado e levado em malas para Mianmar, onde a maioria dos pagamentos é feita em dinheiro. Grande parte da paisagem urbana de Rangum parece congelada no tempo, com táxis em estágio de decomposição, prédios coloniais abandonados e ruas esburacadas.

Conseguir a suspensão das sanções é outra das motivações das reformas. Investimento e negócios com o Ocidente - principalmente os EUA - poderão contrabalançar a enorme presença econômica conquistada pela China nos últimos 20 anos.

Washington condicionou o levantamento das sanções a uma série de compromissos. O mais imediato é realização de eleições abertas, justas e transparentes no dia 1.º de abril. "Eleições livres são extremamente importantes para a legitimidade do processo de reforma", reconhece Ko Ko Hlaing, conselheiro político do presidente Thein Sein. Segundo ele, as autoridades analisam a possibilidade de permitir a entrada no país de observadores internacionais durante o pleito.

A pressa dos militares também é motivada pela escolha de Mianmar para presidir a Asean (Associação das Nações do Sudeste Asiático) em 2014, uma vitória diplomática importante para um país até o ano passado tratado como "pária" internacional. Mianmar faz parte do grupo desde 1997 e deveria ter ocupado sua presidência em 2006, mas os militares desistiram da posição em razão da pressão contrária dentro e fora da Asean.

Para exercer a presidência, o país terá de melhorar toda sua infraestrutura e estar aberto a receber chefes de Estado e centenas de jornalistas que acompanharão o encontro.