Título: Filhos estrangeiros crescem em Valadares
Autor: Gerbelli, Luiz Guilherme
Fonte: O Estado de São Paulo, 12/02/2012, Economia, p. B16

Retorno dos pais para a cidade mineira obriga os filhos nascidos nos Estados Unidos a se adaptarem à realidade brasileira

Um geração de valadarenses com dupla nacionalidade está crescendo na cidade. Eles nasceram no exterior depois que os pais deixaram o País na década de 80 e 90. "Já estamos completando uma geração de brasileiros nos Estados Unidos e já está em formação uma geração de americanos em Governador Valadares", diz Raimundo Santana, gerente do Programa Emigrante Cidadão (PEC). Ele mesmo viveu por cinco anos nos Estados Unidos.

O empresário André Ferreira da Costa, de 45 anos, viveu essa situação. Ele se mudou para os EUA em 1986. Começou a vida americana em Nova York, numa fazenda, depois se mudou para New Jersey até decidir ir para Flórida, onde abriu uma empresa de pintura em sociedade com o irmão. "O clima do norte dos EUA era muito frio. Não dava para viver lá", diz. Ele teve três filhos nos EUA - hoje, os meninos estão com 11, 18 e 19 anos - e todos têm cidadania americana. "A adaptação deles ao Brasil foi meio difícil, mas aos poucos se acostumaram", diz o empresário.

André voltou definitivamente para o País em 2009, no auge da crise econômica internacional. A empresa na Flórida viu o quadro de funcionários cair de 300 para 15 em apenas seis meses. "Eu tive de mandar toda a família de volta antes e fiquei mais um ano vivendo sozinho lá, até vender tudo o que tinha", afirmou. Hoje, morando no bairro São Pedro, diz que a vida "vai melhorando".

Um pouco mais afastado do centro de Governador Valadares, no bairro São Raimundo, a pequena Virginia Brasileiro Correia, de 4 anos, atende o pedido da mãe em inglês para buscar o ventilador, mas as broncas são em bom português. A menina nasceu nos Estados Unidos e morou com os pais no Estado de Connecticut. "A minha filha teve um pouco de alergia com leite, ovo, e trigo. Mas ela não sofreu muito para voltar. Ela 'radiou', porque aqui fica mais livre", diz a mãe, Edna Lucia Brasileiro, de 33 anos, que viveu por 13 anos nos Estados Unidos.

Nos Estados Unidos, Edna trabalhou com limpeza. Teve lesão por esforço repetitivo (LER) e parou de trabalhar. Decidiu voltar ao Brasil em setembro do ano passado, não por causa da crise, mas pela saúde. "Chegamos lá e já tínhamos uma vida estabilizada, a gente perdeu um pouco, lógico. Todo mundo perdeu. Mas nada que afetasse muito na nossa vida", afirmou. Até hoje, enfrenta problemas com o contêiner com os móveis que embarcou dos Estados Unidos e está parado na Receita. "Meu marido ficou nos Estados Unidos, tentando agilizar a situação." diz. "Eu nem consegui começar direito a minha vida. Porque nem minha casa eu consegui montar."

Os relatos de retorno dos valadarenses dos países em crise se espalham pela cidade. A identificação com o exterior é tanta que no dia 4 de julho, quando é comemorada a independência dos Estados Unidos, a cidade comemora o Dia do Imigrante.

"A maioria dos emigrantes nas décadas de 80 e 90 eram homens e mulheres na faixa etária de 20 a 40 anos, com uma média de 8 a 12 anos de escolaridade. Apenas 3,5% estavam desempregados quando emigraram, contudo ganhavam em média 1 a 3 salários mínimos", diz a socióloga e professora da Universidade Vale do Rio Doce (Univale), Sueli Siqueira.