Título: Em Port Said, moradores culpam governo por massacre
Autor: Netto, Andrei
Fonte: O Estado de São Paulo, 06/02/2012, Internacional, p. A13

Indignados contra o regime militar que governa o Egito, moradores de Port Said e torcedores do Al-Mahly foram às ruas ontem para denunciar o governo como o verdadeiro responsável pela morte de 74 pessoas - entre elas 5 moradores - no estádio de futebol da cidade, na quarta-feira. O Estado esteve no município ontem e ouviu denúncias de que a polícia e as Forças Armadas teriam contratado falsos torcedores que, armados com facas e rojões, promoveram o massacre.

A "guerra do futebol", como vem sendo chamada no Egito, não tem nada a ver com o esporte. Esse é o primeiro argumento dos moradores de Port Said, cidade portuária de 600 mil habitantes no nordeste do país. "Este é um crime político. Os criminosos foram pagos para virem aqui no jogo entre Al-Ahly e Al-Mahly. O governo queria essa tragédia", diz Mohamed Soph, contador de 27 anos.

Usadas pelo regime militar durante os 29 anos de governo de Hosni Mubarak, torcidas organizadas - chamadas de "ultras" - desempenharam papéis relevantes nos protestos contra e a favor do governo em fevereiro de 2011, na Praça Tahrir, no Cairo, e em outras cidades do Egito. Um ano depois, os ultras do Al-Ahly, favoráveis à revolução, teriam sofrido a vingança. Desde o dia do massacre, os torcedores do Al-Mahly são apontados como culpados, ao lado da polícia e do Ministério do Interior. Essa culpa, porém, é negada pelos moradores de Port Said.

Desde a tragédia pós-jogo, vencido pelo Al-Mahly por 3 a 1, a opinião pública egípcia mostra-se convicta da premeditação do crime. Pesam contra o governo as imagens das tropas de choque inertes no campo, em meio ao massacre, e as informações de que os portões do estádio teriam sido fechados para que ninguém saísse. Ao Estado, o cientista político egípcio Omar Ashour diz não ter dúvidas da conivência das forças de segurança. "A tragédia de Port Said é um desastre humano, social e político." / A.N.