Título: Estrutura ruim para aviação executiva nos grandes eventos já traz preocupação
Autor: Gonçalves, Glauber
Fonte: O Estado de São Paulo, 21/02/2012, Negócios, p. B6

Transporte. Especialistas alertam que País não está preparado para receber o grande fluxo de aviões executivos que deve ser provocado por eventos como Copa do Mundo e Olimpíada; Infraero diz que está destinando recursos específicos para o setor

A previsão de um fluxo de centenas de jatos executivos transportando bilionários, altos executivos, chefes de Estado, convidados VIP de patrocinadores e celebridades durante a Copa do Mundo de 2014 está preocupando o setor aéreo, que teme congestionamento e caos durante o evento.

A avaliação de especialistas é que o governo federal está de costas para o segmento de aviação executiva e ainda não tem um plano de investimento em infraestrutura para atender a esse segmento.

Apesar de a aviação regular ter prioridade nos grandes aeroportos do País, o temor é de que, com o gargalo, as autoridades brasileiras acabem cedendo às pressões dos passageiros influentes dos jatos e os aloquem nos aeroportos centrais, mais próximos aos locais dos jogos.

Sem espaço para pousar ou decolar, os voos regulares teriam de ser direcionados para aeroportos secundários, em outras cidades, exigindo um longo descolamento de ônibus ou táxi para os eventos.

"O governo brasileiro dá preferência à aviação regular, em que um avião carrega 200 passageiros. Eles estão de certa forma "contra" a aviação executiva", avalia o especialista em transporte aéreo Nelson Riet. "Mas, de algum jeito, isso vai acabar sendo revertido (na Copa), e o agravante é que os donos de aviões executivos são pessoas que detêm poder", diz.

Os alertas são feitos com base no que aconteceu na época de Copa de 2010, na África. Na época, centenas de torcedores que iam para Durban assistir à disputa entre Alemanha e Espanha pelas semifinais perderam a partida porque seus voos não puderam pousar depois que as autoridades fecharam o aeroporto por causa do congestionamento da pista, causado por aeronaves privadas, informou na ocasião o diário Financial Times.

Segundo o jornal britânico, entre as celebridades que chegaram em seus jatos estariam o rei Juan Carlos, da Espanha, o presidente da África do Sul, Jacob Zuma, o ator Leonardo di Caprio e a socialite Paris Hilton.

Mudança. A aviação executiva cresceu e se sofisticou no Brasil e no mundo nos últimos anos. A palavra jatinho se tornou inapropriada para designar os aviões usados por grandes empresários para se locomover com agilidade. Hoje, eles chegam a ter a mesma dimensão de um avião que em um voo comercial regular acomodaria tranquilamente mais de cem pessoas.

A infraestrutura aeroportuária, no entanto, não avançou no mesmo compasso. Os aeroportos de Campo de Marte, em São Paulo, e de Jacarepaguá, no Rio, voltados para atender à chamada aviação geral, não têm pistas com dimensões amplas o suficiente para suportar o pouso de aeronaves maiores, como o Gulfstream G550, que integra a frota do bilionário Eike Batista.

Uma ampliação das pistas nesses dois aeroportos é praticamente impossível. No caso de Jacarepaguá, de um lado, o aeroporto está colado a mega condomínios da Barra da Tijuca, bairro preferido dos novos ricos cariocas. A proximidade impõe limitação ao crescimento da infraestrutura e gera problema de ruídos para os moradores, que se mudaram para a região muito tempo após a construção do aeroporto. O caso de Campo de Marte é semelhante.

No entanto, mesmo que ambos suportassem a aterrissagem de grandes aviões, os jatos que vêm de outros continentes não poderiam pousar lá, uma vez que esses aeroportos não são internacionais. Um grande jato com autonomia para voar de Moscou para São Paulo precisa pousar em Guarulhos, um dos aeroportos mais congestionados do País. No caso do Rio, é preciso desembarcar no Galeão, que ainda tem capacidade ociosa.

O problema é que esses aeroportos não têm uma estrutura adequada para atender o público da aviação executiva, que busca mais agilidade e privacidade nos trâmites burocrático.

"É muito ruim o Brasil sediar uma Copa e não ter espaço para os aviões executivos", diz o especialista em infraestrutura aeroportuária Anderson Correia. "Quando chega ao País um executivo internacional, ele tem de descer em Guarulhos numa situação desconfortável, sem infraestrutura", avalia.

Para o consultor José Wilson Massa, porém, o governo pode evitar uma situação caótica na época da competição com planejamento prévio. Para isso, vai ter de lançar mão de aeroportos mais distantes, como os de Angra dos Reis, Cabo Frio e bases aéreas, no caso da final no Rio.

A Infraero, estatal que administra os principais aeroportos do País, afirma que está destinando recursos para melhorar a estrutura voltada para aviação executiva. "Temos de olhar os dois segmentos. Não podemos ignorar (a aviação executiva)", disse o diretor de aeroportos da estatal, João Márcio Jordão. Ele revelou, porém, que, por enquanto, a Infraero não planeja investir em um terminal exclusivo para esse segmento.

Procurada, a Secretaria de Aviação Civil (SAC) da Presidência da República não se pronunciou sobre o assunto.