Título: Ex-pacientes com hanseníase serão indenizados por funções não pagas
Autor: Thomé, Clarissa
Fonte: O Estado de São Paulo, 18/02/2012, Vida, p. A12

Uma lei estadual do Rio vai reparar os anos de trabalho sem remuneração de pacientes de hanseníase dos chamados hospitais-colônia que cuidaram dos internos em estado mais grave - 353 ex-pacientes serão indenizados.

Por mais de cinco décadas, foram os próprios pacientes que cuidaram dos colegas mais debilitados. Faziam curativos, preparavam as refeições, limpavam as instalações. Se no início havia falta de pessoal - poucos queriam ter contato com "leprosos" -, mais recentemente os governantes se aproveitaram daquela mão de obra barata.

A Lei 1.188/2012 estabelece a pensão vitalícia para aqueles que não têm condições de voltar ao mercado de trabalho nem recebem nenhum tipo de benefício. Os aposentados ou ainda aptos receberão parcelas mensais de R$ 622 - 1 salário mínimo nacional - por dez anos. Os que estão em atividade no Instituto Estadual de Dermatologia Sanitária e no Hospital Estadual Tavares Macedo terão a carteira assinada. Os pagamentos devem começar a ser pagos até 9 de abril.

Há dois tipos de ex-pacientes que trabalharam nos hospitais: os internados compulsoriamente, entre as décadas de 1940 e 1980, e os internados após o fim da Lei do Isolamento, o que ocorreu até 1986.

"Se antigamente poucos profissionais aceitavam trabalhar com hanseníase, nos anos 1990 o Estado, já viciado nessa mão de obra barata, criou o que se chamava laborterapia, uma terapia do trabalho em que os funcionários ganhavam menos de 1 salário mínimo", diz Artur Custódio, conselheiro nacional de saúde e presidente do Movimento de Reintegração das Pessoas Atingidas pela Hanseníase.

Há várias maneiras de se referir a esses trabalhadores: pacientes da laborterapia, da "folha interna", bolsistas albergados. "No fundo, era uma mão de obra fácil e barata", diz Mauro Barroso Fernandes, de 52 anos, internado aos 40, que esteve à frente da luta pela indenização. Ele foi auxiliar de eletricista, trabalhou na guarda interna, cuidou da documentação médica. O primeiro salário foi de R$ 112, quando o mínimo nacional era de R$ 151. "A indenização deveria ser vitalícia para todo mundo", diz ele, que trabalha como maqueiro.

Dalva Mendonça Pedro, de 50 anos, vive ali desde 1984, quando foi internada compulsoriamente. Ela assumiu várias funções - auxiliar de cozinha, copeira de enfermaria, recepcionista. Com o dinheiro da indenização, sonha comprar uma casa fora da área do Tavares Macedo. "Hospital é para se tratar. Viver em hospital não existe. Quero um dia apagar tudo o que vivi aqui."

Custódio afirma que o País vive um paradoxo: é o primeiro em incidência de hanseníase e considerado o que mais avançou nas políticas afirmativas com relação às colônias. "Essa indenização é mais um passo importante. O Rio foi o primeiro a dar a titularidade de terra aos moradores das casas da antiga colônia de Curupaiti, em Jacarepaguá."