Título: Irã pede diálogo, mas suspende venda de petróleo a França e Grã-Bretanha
Autor: Chacra, Gustavo
Fonte: O Estado de São Paulo, 20/02/2012, Internacional, p. A8

Retaliação. Teerã antecipa-se a embargo do combustível iraniano, que entrará em vigor a partir de julho, e diz que não terá problemas para encontrar novos compradores; próximo encontro com o sexteto será realizado na Turquia, mas data não foi marcada

O Irã suspendeu ontem as exportações de petróleo para França e Grã-Bretanha antecipando-se ao embargo imposto pela União Europeia que passará a vigorar a partir de julho. A decisão foi anunciada depois de o regime de Teerã concordar em discutir sobre seu programa nuclear com o chamado sexteto, composto pelos cinco membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU, mais a Alemanha.

"As exportações de petróleo para a Grã-Bretanha e a França foram suspensas. Temos nossos próprios clientes e não vemos problemas em vender petróleo para novos compradores", disse Ali Reza Nikzad-Rahbar, porta-voz do Ministério do Petróleo do Irã. Ao todo, a União Europeia é responsável pela compra de 18% das exportações iranianas. Os principais destinos dos barris iranianos no continente são Grécia, Itália e Espanha, que não foram incluídas na suspensão determinada por Teerã e enfrentam grave crise econômica.

A decisão de escolher como alvo justamente britânicos e franceses deve-se ao tom duro que Londres e Paris vêm adotando contra o regime de Teerã. Ainda ontem, o chanceler britânico, William Hague, acusou o Irã de ameaçar a paz mundial por sua crescente vontade de "realizar atividades ilegais e potencialmente terroristas". O ministro referia-se aos recentes atentados contra alvos israelenses na Índia e na Geórgia. Teerã nega ter envolvimento nos atentados e acusa Israel de estar por trás dos recentes assassinatos de cientistas iranianos.

No mês passado, a União Europeia, em acordo com os Estados Unidos, decidiu adotar um embargo contra o petróleo iraniano. A medida, porém, só será aplicada a partir de julho para que os países possam encontrar novos fornecedores. As importações de petróleo iraniano reduziram-se em 300 mil barris por dia - cerca de um terço do total nos últimos meses.

Empresas como a Shell e a Total praticamente eliminaram seus negócios com o regime de Teerã. A Arábia Saudita já anunciou que venderá aos europeus barris para suprir o fim no fornecimento iraniano.

Atualmente, a China e a Índia são os mais importantes compradores de petróleo do Irã. Estas duas nações não concordam com o embargo internacional contra o Irã liderado pelos EUA. Para tentar dificultar a compra por estes dois países asiáticos, os americanos decidiram adotar sanções contra bancos que negociem com o Banco Central iraniano. Mesmo assim, chineses e indianos podem manter as importações de petróleo desde que recebam um preço com desconto dos iranianos. O pagamento poderá ser feito por meio de trocas ou transações financeiras clandestinas.

Os EUA e a União Europeia acusam o regime de Teerã de tentar desenvolver armas nucleares. O Irã, que é signatário do Tratado de Não Proliferação Nuclear (TNP), desmente a acusação e diz que seu programa tem fins civis.

Enquanto Israel ameaça atacar as instalações nucleares iranianas, os EUA e seus aliados europeus ainda acreditam que seja possível uma saída diplomática. Na avaliação deles, o Irã já vem sofrendo consequências das sanções internacionais. Diante do endurecimento nas sanções internacionais, os moradores de cidades como Teerã já começam a estocar alimentos e a inflação estaria se aproximando de 50% ao ano, segundo algumas estimativas. Além disso, o risco de queda do presidente da Síria, Bashar Assad, principal aliado do Irã no mundo árabe, também tem preocupado a república islâmica.

Pressionado e com eleições parlamentares marcadas para o dia 2, o regime do presidente Mahmoud Ahmadinejad poderia estar disposto a ceder. As negociações diplomáticas foram reabertas e ontem o chanceler iraniano, Akbar Salehi, afirmou que o próximo encontro entre membros do regime e autoridades do sexteto ocorrerá em Istambul. A data ainda não foi determinada.

Apesar de manter cautela, a secretária de Estado americana, Hillary Clinton, e a chefe da diplomacia da União Europeia, Catherine Ashton, receberam com otimismo na sexta-feira a proposta iraniana de retomar as negociações diplomáticas.

Hoje, uma missão da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) chega ao Irã para se reunir com autoridades do regime nos próximos dois dias. A última visita ocorreu três semanas atrás.

Em Israel, existe o temor de que os iranianos estejam apenas tentando ganhar tempo com o retorno às negociações, enquanto atingem a chamada "zona de imunidade" - ponto no qual seria impossível conter o programa nuclear iraniano mesmo por meio de ataques (mais informações nesta página).

Alguns céticos, incluindo o ex-chefe do Mossad Meir Dagan afirmam que mesmo as ações militares seriam inócuas. A consultoria de risco político Exclusive Analysis coloca em 60% a chance de Israel iniciar uma operação contra o programa nuclear iraniano.

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