Título: O superávit primário não resolve todos os problemas
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Fonte: O Estado de São Paulo, 23/02/2012, Economia, p. B2

O Banco Central (BC), sob o comando de Alexandre Tombini, deu finalmente atenção à política fiscal do governo federal. O Comitê de Política Monetária (Copom) considera que, se o governo de fato conseguir atingir a meta de um superávit primário de R$ 139,9 bilhões, será possível controlar a inflação.

O destaque que o BC deu aos gastos do governo nos parece um grande progresso, pois eles sem dúvida estão criando uma liquidez que não favorece o controle da inflação. Todavia, há uma ilusão quanto ao peso do superávit primário.

Não se pode esquecer de que a função principal do superávit primário é, antes de tudo, gerar recursos para pagar uma parte dos juros da dívida pública, ou seja, para reduzir o déficit nominal. Portanto, é necessário examinar com quais recursos a meta do superávit primário é alcançada, como também verificar qual será o montante das despesas com o superávit primário permanecendo igual ao do ano anterior.

O objetivo de uma política fiscal sadia é dosar a liquidez do público para que ela não leve a um aumento da demanda, que favorece a inflação. Se, como no ano passado, o valor do superávit primário, estabelecido pela Lei das Diretrizes Orçamentárias (LDO), é alcançado graças aos dividendos do BNDES, não houve restrições à liquidez do público.

Talvez o mais grave é quando os gastos do governo federal aumentam, mesmo depois do corte de R$ 55 bilhões, e o superávit primário fica com o mesmo valor do ano anterior.

E há uma outra questão: em 2011 o governo atingiu a meta do superávit primário sacrificando investimentos. Neste ano, segundo as declarações da presidente da República e do seu ministro da Fazenda, será dada prioridade aos gastos com infraestrutura. Já notamos em editoriais que o corte de R$ 55 bilhões não é muito sério e atinge especialmente emendas ao projeto do governo.

Para dinamizar os investimentos, seria necessário cortar despesas de custeio. Não se fala disso. Assim, podemos temer que os gastos com investimentos sejam maiores do que no ano passado. O superávit primário poderá ser atingido, mas não diminuirá a liquidez da economia.

Caberá ao Banco Central - que agora considera mais eficientes as medidas macroprudenciais - atuar para eliminar o excesso de liquidez que terá origem no excesso de gastos do governo federal. Não podemos esquecer de que, no ano passado, as medidas macroprudenciais tiveram uma grande responsabilidade na queda da atividade econômica.