Título: 'Assad não é aceitável nem para regime de transição
Autor: Chade, Jamil
Fonte: O Estado de São Paulo, 26/02/2012, Internacional, p. A14/15

Para líder opositor sírio, proposta de reforma constitucional síria apresentada por Bashar Assad não é séria

Membros do Conselho Nacional Sírio, que reúne a oposição no exílio, têm feito pedidos à comunidade internacional que vão da entrega de armas aos combatentes rebeldes até uma intervenção militar para derrubar o regime de Bashar Assad. Já integrantes do Comitê de Coordenação Nacional, que representa os opositores na Síria, tendem a ter uma posição mais branda. É o caso do cientista político Hussein al-Odat, de 75 anos. "A intervenção é muito perigosa, porque não vai destruir apenas o regime, mas o Estado sírio, a administração, as empresas", adverte Odat, em entrevista ao Estado, pelo telefone, de Damasco. Ao mesmo tempo, Odat, autor de 15 livros sobre política interna e regional, afirma que o referendo de hoje sobre a proposta de Constituição apresentada por Assad "não é sério" e prevê um comparecimento de apenas 5% a 10% dos eleitores. Para ele, a permanência de Assad no poder não é aceitável, nem sequer num processo de transição. Formado no ano passado, o Comitê reúne 12 grupos oposicionistas sírios.

Como a comunidade internacional pode ajudar os sírios?

Há muitas formas de ajudar: pressões econômicas e políticas sobre o regime para mudar essa política contra as manifestações, contra a população. Em segundo lugar, é possível enviar ajuda para as pessoas. Em terceiro, trabalhar e pressionar para salvar os moradores que tentam sair de algumas cidades (sob bombardeio) e não conseguem.

Mas os sírios aceitariam uma ação militar para fazer chegar essa ajuda, já que o Exército sírio impediria a sua entrada?

Acredito que não seria proveitoso. O mais importante é (o que se faz) dentro da Síria, entre os sírios, ou seja, a unidade da oposição, sua coordenação com a população, a pressão interna contra o regime. A intervenção militar é muito perigosa, porque não vai destruir só o regime, mas o Estado sírio, a administração, as empresas, etc. Já temos muita experiência: no Iraque, na Líbia, no Afeganistão.

E o que o sr. acha de dar armas ao Exército Livre Sírio?

Acho que agora, não importa de quem sejam as armas, haverá conflito militar e não sabemos a que ponto isso vai chegar. É muito perigoso. A solução para a Síria não é militar.

O que o sr. pensa sobre o referendo de domingo (hoje)?

Acho que não é sério, porque a Constituição proposta é a mesma da anterior. Não muda nada. O presidente formou uma comissão do Estado para preparar a Constituição. Não houve uma participação de todos. Portanto, o projeto de Constituição não representa as correntes políticas, econômicas e culturais da sociedade síria. Por isso acho que apenas entre 5% e 10% dos eleitores participarão.

Vocês aceitam que o presidente Bashar Assad permaneça no poder durante uma transição?

Isso teria sido possível dez meses atrás. Agora, já não é mais, porque o povo exige uma mudança radical do regime, a saída de todas as autoridades do governo, para criar um regime democrático.

Por que a oposição está dividida?

Até o momento não há uma divisão. O que há são projetos que a dividem. A oposição no exterior é composta de correntes islâmicas e liberais. Já a interna é formada por correntes nacionalistas e de esquerda.

Qual a situação em Damasco?

No centro de Damasco continua calmo. Mas ao redor há muitos problemas, há manifestações, confrontos com as forças de segurança, etc.

Há comida?

Sim, há muito o que comer, apesar de o preço de tudo ter subido entre 20% e 40%. Tem faltado diesel para o aquecimento (das casas). Houve falta de gás, mas no momento não. Faltam alimentos em algumas cidades, como Homs, Idlib e Deraa. Nas outras, tem tudo.

Vocês têm acesso à internet?

Sim, claro.