Título: Pobreza extrema recua apesar do declínio global
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Fonte: O Estado de São Paulo, 08/03/2012, Economia, p. B12

Estudo do Banco Mundial mostra que a proporção da população que sobrevive com menos de US$ 1,25 por dia caiu entre 2005 e 2008

Um estudo do Banco Mundial indica uma ampla redução na pobreza extrema - e mostra que, contrariando a expectativa dos economistas, a recessão global não aumentou a pobreza no mundo em desenvolvimento.

O estudo mostra que, pela primeira vez, a proporção da população que vive em condições de pobreza extrema - sobrevivendo com menos de US$ 1,25 por dia - caiu em todas as regiões em desenvolvimento entre 2005 e 2008. E a maior recessão já vista desde a Grande Depressão parece não ter desestabilizado esta tendência, de acordo com dados preliminares de 2010.

O progresso é tão acentuado que o mundo atingiu o objetivo de reduzir pela metade a pobreza extrema - previsto nas Metas de Desenvolvimento das Nações Unidas para o Milênio - cinco anos antes do prazo limite de 2015.

"Trata-se de uma ótima notícia", disse Jeffrey Sachs, diretor do Instituto Terra da Universidade Columbia e conselheiro especial da ONU para as Metas de Desenvolvimento para o Milênio. "Verificou-se um progresso amplo no combate à pobreza, e seu avanço é cada vez mais rápido. Há muitos motivos para comemorar." O estudo indica que, embora o mundo tenha entrado numa recessão em 2009, a pobreza não aumentou nos países em desenvolvimento. Isso contraria as expectativas do próprio Banco Mundial. Num relatório publicado no fim de 2008, a instituição de Washington voltada para o fomento ao desenvolvimento alertou: "O desemprego está aumentando nos países industriais e a pobreza deve aumentar nos países de renda baixa e média, trazendo consigo uma deterioração substancial nas condições de vida enfrentadas pelas pessoas em situação mais vulnerável".

Mas isto não ocorreu. Estudos preliminares para o ano de 2010 mostram que a proporção de habitantes vivendo em condições de pobreza extrema caiu nos países em desenvolvimento.

Isso decorre do crescimento expressivo observado em países como Brasil, Índia e, especialmente, China - que ajudou a sustentar economias na África e na América do Sul. O alto preço das commodities também ajudou os países exportadores.

As condições de mercado também favoreceram os países em desenvolvimento. Os economistas tinham teorizado que o aperto no crédito e a recessão provocariam uma fuga em busca da segurança dos países desenvolvidos. Mas, pouco depois da recessão, com o crescimento estagnado em países como os Estados Unidos e na Europa Ocidental, os investidores de todo o mundo aplicaram seu dinheiro nos mercados emergentes.

"No passado, crises econômicas nos países ricos traziam um impacto expressivo e imediato para os países em desenvolvimento", disse Charles Kenny, bolsista sênior do Centro para o Desenvolvimento Global, uma instituição de pesquisas com sede em Washington. "Mas, desta vez, o impacto foi muito menor, e os países em desenvolvimento não seguiram os EUA e a Europa, onde se viram longas recessões e uma lenta recuperação." "Trata-se de ótimas notícias para todos os envolvidos", acrescentou Kenny, "pois o crescimento nos países em desenvolvimento também ajudou os países desenvolvidos".

O estudo continha um conjunto de estatísticas mostrando amplos declínios na pobreza no decorrer da década de 2000. Pela primeira vez desde que o Banco Mundial começou a acompanhar esses dados, em 1981, a pobreza caiu em todas as regiões do mundo durante três anos. Na África Subsaariana, a proporção da população vivendo na pobreza extrema ficou abaixo de 50% pela primeira vez. E, entre 1981 e 2008, a pobreza que antes afetava mais da metade da população dos países em desenvolvimento foi reduzida a ponto de afetar menos de um quarto dessa mesma população.

Boa parte da mudança ocorreu na China, que tirou da pobreza quase 700 milhões de pessoas entre 1981 e 2008. A proporção de chineses vivendo em condições de extrema pobreza, que chegava a 84%, foi reduzida para apenas 13%. O ritmo anual de crescimento no país nunca ficou abaixo dos 9%, mesmo em 2009, quando a economia mundial sofreu uma contração.

Mas a história de sucesso mais surpreendente deve ser a da África Subsaariana, onde a proporção de pessoas vivendo na extrema pobreza aumentou nos anos 90 antes de cair nos anos 2000.

"As pessoas se perguntavam se a África estaria condenada a ser sempre pobre", disse Kenny, do Centro para o Desenvolvimento Global. "Bem, agora parece que as coisas não serão assim." A pobreza extrema no Oriente Médio e no Norte da África passou a afetar apenas 2,7% da população em 2008, sendo que, em 2002, 4,2% dessa população ainda sofria com tais condições. Na África Subsaariana, onde a pobreza extrema atingia 55,7% das pessoas em 2002, essa proporção caiu para 47,5% em 2008.

"As mudanças de longo prazo estão começando a fazer efeito", disse Sachs, citando condições favoráveis do mercado, políticas de combate aos problemas de saúde pública e mudanças tecnológicas que levaram às áreas mais remotas ferramentas como os celulares e a conexão à internet.

Sachs disse que a mudança climática e as secas e enchentes que decorrem dela, a ameaça de conflitos armados e a persistência de uma taxa de natalidade altíssima entre os muito pobres ameaçavam reverter o declínio na pobreza. Mas ele disse que o mais provável era que esta tendência continuasse a melhorar. "Ao analisar o conjunto dos dados, vemos que esta é uma época muito promissora para o combate à pobreza", disse Sachs.

Em separado, a ONU anunciou que o mundo tinha atingido o objetivo de reduzir pela metade a proporção da população sem acesso à água potável cinco anos antes de 2015, prazo limite estipulado pelas Metas de Desenvolvimento para o Milênio. Entre 1990 e 2010, mais de dois bilhões de pessoas obtiveram o acesso à água potável de melhor qualidade, de acordo com um relatório elaborado conjuntamente pela Unicef e pela Organização Mundial de Saúde. Agora, 89% da população mundial têm acesso a esse recurso, um aumento em relação aos 76% registrados em 1990. / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL