Título: Indústria química tem déficit recorde
Autor: Gerbelli, Luiz Guilherme
Fonte: O Estado de São Paulo, 18/03/2012, Economia, p. B6

Produção perde competitividade e enfrenta enxurrada de importados; rombo do setor foi de US$ 25,9 bi em 2011, o maior da história

O setor químico é o retrato mais fiel dos efeitos da baixa produtividade da indústria do País. No ano passado, teve déficit de US$ 25,9 bilhões, o maior da história - em 1990 era de US$ 1,5 bilhão. A grandeza do rombo fica evidente quando se leva em conta que ele é só um pouco menor do que o saldo comercial de 2011 do País, de US$ 29,7 bilhões.

Por trás desse resultado - invisível aos olhos do consumidor final -, que indica uma perda de terreno dos produtos nacionais para os importados, estão problemas antigos do País que passam pelo sistema tributário caótico, infraestrutura deficiente e terminam nos conhecidos juros elevados.

"Os dados que a gente tem apontam para o crescimento do consumo de 6,5% no ano passado, mas a importação cresceu 7,5%", afirma o presidente da Braskem, Carlos Fadigas. "A importação ficou com todo o crescimento e tomou 1% do mercado."

O reflexo desses entraves brasileiros aparece sobretudo no custo da matéria-prima. O gás obtido nos Estados Unidos, por exemplo, é, em média, 20% mais barato do que o brasileiro. O preço da energia cobrado também destoa dos demais países.

"O País tem um problema muito grande. É quase 10% mais caro trazer matéria-prima do Polo de Camaçari para São Paulo do que da Europa para São Paulo, por exemplo", diz Michel Mertens, vice-presidente sênior de áreas químicas da Basf para a América do Sul.

No ano passado, a Basf fechou a fábrica de aminas em Camaçari porque a importação ficou mais vantajosa, mas anunciou a criação de um Complexo Acrílico. O investimento deve somar cerca de US$ 750 milhões e tem previsão de início em 2014.

Portos. Outra barreira que tem custado caro para a produção nacional é a chamada "guerra dos portos", alimentada pelos incentivos fiscais que alguns Estados, como Santa Catarina e Espírito Santo, concedem para as importações. "Os governadores descobriram que quanto mais produto chegava no porto deles, mais ICMS eles iriam recolher no desembaraço do produto", afirma Carlos Fadigas.

Para ter preferência no desembarque, alguns Estados estão devolvendo até 10% dos 12% da alíquota do ICMS para as empresas que escolhem seus portos para o desembarque. "Ainda que o exportador ganhe 10%, ele fica com o benefício e isso não se espalha pela cadeia", diz o presidente da Braskem. "Nenhum país incentiva a importação."

A perda de espaço para os importados não é novidade para a indústria química. O déficit do setor aumenta desde 1990, com a abertura da economia brasileira. Desde então, foram fechadas 1.710 unidades de produção em todo o País, de acordo com estudo da Associação Brasileira da Indústria Química (Abiquim).

A entidade analisou o fechamento de 345 unidades associadas e constatou que cerca de 80% delas encerra as atividades por falta de competitividade. As demais fecharam por uma decisão estratégia das empresas ou porque a vida útil do produto acabou. "Esses fechamentos resultaram em um aumento do déficit acima de US$ 10 bilhões", afirma o presidente executivo da Abiquim, Fernando Figueiredo.

Os problemas estruturais afetaram a perda de competitividade do setor. A atual participação da indústria química no Produto Interno Bruto (PIB) do País é de 2,5%. Em 2004, quando atingiu a maior relevância da história, foi de 3,6%.