Título: Dilma faz gesto político ao instalar 19 Conselhos
Autor: Otta, Lu Aiko
Fonte: O Estado de São Paulo, 03/04/2012, Economia, p. B2

Governo reedita experiência das câmaras setoriais para dialogar com empresários e trabalhadores sobre medidas específicas para a indústria

Além de novas desonerações tributárias e facilidades para o crédito, a presidente Dilma Rousseff pretende fazer hoje um gesto político, ao instalar 19 Conselhos de Competitividade. Quer demonstrar a disposição de dialogar com empresários e trabalhadores a respeito de medidas específicas para os setores.

Entidades representativas de patrões e empregados planejam para amanhã uma manifestação conjunta em São Paulo em defesa da produção e do emprego. Os conselhos foram prometidos no lançamento do Brasil Maior, em agosto de 2011. Pelo cronograma oficial, deveriam ter sido instalados no dia 16 passado.

A experiência brasileira mostra que esse tipo de interlocução pode dar certo, como pode dar em nada. "Eu tenho experiência nos dois", disse ao Estado a ex-ministra da Indústria e Comércio Dorothéa Werneck, atual secretária de Desenvolvimento de Minas Gerais. As câmaras setoriais que ela comandou no início dos anos 1990 foram as responsáveis pela sobrevivência de setores depois da abertura comercial. A experiência foi retomada em 1995, sem sucesso.

"Para dar certo, precisa de três coisas que não são somatórias: uma agenda clara, quem negocia tem de ser representativo e ter vontade de negociar." Se faltar uma, diz ela, o fracasso é certo.

Agenda definida. Segundo a ex-ministra, a falta de uma agenda bem definida compromete a negociação. "O cara vai na primeira reunião, na segunda talvez, na terceira de jeito nenhum." É importante também que quem esteja negociando esteja de fato autorizado a isso, ou seja, o técnico de um ministério tem de falar pela pasta, um sindicalista tem de defender os compromissos ali assumidos perante a categoria.

"Vontade de negociar parece bobagem, mas acho que foi por isso que as câmaras não deram certo em 1995." Sobretudo da parte do governo, quem participa tem de achar que o acordo é importante, e não apenas mais um compromisso do dia. Nas câmaras de 1991 e 1992, o que hoje são os Ministérios da Fazenda, do Planejamento e do Desenvolvimento estavam sob um único ministério, o da Economia, e havia reuniões semanais para discutir as medidas. Em 1995, já eram três separados, o que dificultou os entendimentos.

"Acho que os conselhos podem produzir coisas boas, se não nos 19, pelo menos em alguns." No entanto, ela vê alguns pontos com preocupação. O governo divulgou que as 19 câmaras terão cerca de 600 pessoas. "Eu pergunto: está todo mundo representado? Porque, se não estiver, quem ficou de fora vai trabalhar contra." No acordo automotivo que ela comandou, havia 106 entidades representadas.

Causa preocupação também o fato de alguns conselhos reunirem temas muito diferentes, como o conselho de petróleo, gás e indústria naval. O mesmo se aplica ao da agroindústria, onde estarão temas com problemas tão diversos como soja e etanol.

Há, além disso, limites para a adoção de medidas, observou o deputado Vicente Paulo da Silva, o Vicentinho (PT-SP). "Se ficar na preocupação de não perder arrecadação de imediato, não vai evoluir." Na semana passada, ele defendeu em discurso a retomada das câmaras setoriais.