Título: ONU ampliará número de observadores na Síria
Autor: Santanna, Lourival
Fonte: O Estado de São Paulo, 20/04/2012, Internacional, p. A15

Missão é recebida com festa em três cidades do país e ouve de moradores relatos de assassinatos e de outros abusos cometidos pelo regime de Assad

Enquanto a missão avançada de observadores fazia seu primeiro contato direto com os moradores na Província de Deraa, no sul da Síria, o governo sírio e a ONU firmaram ontem um acordo que abre caminho para a ampliação do contingente. Os observadores foram recebidos como heróis nas três cidades que visitaram. Centenas de moradores os rodearam e contaram que os tanques e as tropas tinham sido retirados só ontem em razão de da sua vinda.

Aos cinco observadores da equipe avançada estão se somando gradualmente outros militares da ONU, que deverão chegar a 30 integrantes, conforme resolução do Conselho de Segurança aprovada no sábado. Com o acordo firmado ontem, a ONU deve aprovar nova resolução autorizando a ampliação para cerca de 300 observadores.

A Síria pretende influir na escolha da nacionalidade dos militares e dá preferência a Brasil, Rússia, China, Índia e África do Sul, considerados países mais amigáveis ao regime de Bashar Assad. O capitão de mar e guerra brasileiro Alexandre Feitosa já faz parte da equipe avançada.

Os observadores partiram ontem de manhã de Damasco em dois jipes da ONU, escoltados por um batedor e dois carros com agentes de segurança sírios. Ao chegar perto da entrada da primeira cidade que visitariam, Harbet Ghazali, 100 quilômetros ao sul de Damasco, a escolta deixou os veículos da ONU seguirem sozinhos, juntamente com o carro do repórter do Estado, o único jornalista que cobriu a visita. Duas equipes de TV sírias, que acompanhavam o comboio na estrada, ficaram para trás.

A missão foi recebida com festa pelos moradores. Líderes locais fizeram relatos sobre a situação nas três cidades visitadas, enquanto os moradores faziam manifestações contra o regime e relatavam atrocidades ao repórter do Estado.

Falando em árabe, o coronel marroquino Ahmed Himmiche, comandante da equipe avançada, questionou se normalmente havia tanques e tropas ao redor das cidades. Os moradores responderam que sim, que haviam sido retirados apenas por causa da vinda da missão.

Um dos seis pontos do plano de paz do mediador da ONU e da Liga Árabe, Kofi Annan, é o fim do cerco das cidades pelo Exército sírio. Um morador de Assura disse ao Estado que, normalmente, 20 tanques cercam a cidade e há barreiras militares em todos os seus 13 acessos.

Himmiche explicou à população que observadores da ONU seriam "hóspedes" deles e viriam morar em suas cidades, para monitorar o cessar-fogo em vigor há uma semana. Ele e os outros quatro militares da ONU eram seguidos pelas ruas e avenidas por centenas de moradores que gritavam: "Deus é maior", "O povo quer a queda do regime", "O povo quer exterminar o presidente" e "Não nos curvamos a Bashar", dentre outras variações.

Outro morador de Assura disse ao Estado que as pessoas comuns não podem sequer atravessar a avenida que corta a cidade, porque são alvos de franco-atiradores. Moradores de várias localidades disseram que, depois que os observadores deixassem os lugares, eles seriam duramente castigados pelas manifestações. Os moradores de Assura e Herak diziam que Busran Harir, a 8 quilômetros dali, estava sendo bombardeada naquele momento (por volta de 14h30, hora local).

O Observatório Sírio de Direitos Humanos, com base em Londres, informou mais tarde que as forças de segurança sírias abriram fogo em Herak logo depois da saída dos militares da ONU. Segundo a organização, seis pessoas foram mortas no país ontem, dentre elas duas em Homs, no centro-oeste, alvo de disparos de tanques. A missão de observadores teve autorizada sua ida a Homs amanhã.

Drama. Muitos moradores se aproximaram do repórter para contar que seus filhos, pais ou primos foram mortos, presos ou simplesmente desapareceram. Uma mulher em Harbet Ghazali teve o filho morto e a casa queimada. Outra em Herak disse que tanto seu filho quanto seu marido desapareceram.