Título: Mutação genética é associada a autismo
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Fonte: O Estado de São Paulo, 06/04/2012, Vida, p. A14

Duas equipes de cientistas identificaram pela primeira vez várias mutações genéticas relacionadas a um aumento do risco de uma criança desenvolver autismo. Evidências encontradas apontam para uma associação entre a ocorrência do problema e a idade dos pais, principalmente os acima de 35 anos.

As mutações genéticas encontradas são extremamente raras e correspondem a uma pequena fração dos casos de autismo - nestes estudos, o quadro foi apresentado por um pequeno número de crianças. No entanto, especialistas dizem que as novas pesquisas ajudam a desenvolver uma estratégia para avançar na compreensão das bases biológicas da doença.

Há décadas pesquisadores debatem a influência relativa do risco herdado e dos fatores ambientais nos casos de autismo, e há poucos que ainda duvidam da existência de um componente genético relevante. Mas biólogos vinham buscando em vão uma maneira de esclarecer o papel da genética nos chamados distúrbios de espectro autista, incluindo a síndrome de Asperger e as dificuldades sociais associadas apontadas com frequência alarmante nos diagnósticos - a média chega a 1 em cada 88 crianças, de acordo com estimativa divulgada na última semana.

A nova pesquisa - apresentada em três estudos publicados pela revista científica Nature - traz um pouco de luz ao problema. Há provavelmente centenas de variações genéticas capazes de interferir com o desenvolvimento do cérebro a ponto de resultar em atrasos sociais.

Cautela. "Não podemos dizer que os estudos são surpreendentes", disse Jonathan Sebat, professor de psiquiatria e medicina molecular da Universidade da Califórnia. "Mas diria que se trata de um ponto de inflexão. Temos agora um rumo a seguir."

Outros pesquisadores foram mais cautelosos, dizendo que a dinâmica genética das mutações raras ainda não era suficientemente bem compreendida para possibilitar afirmações conclusivas a respeito do seu efeito.

"Trata-se de um grande início, mas não conhecemos a causa dessas mutações raras, e não sabemos o quanto são frequentes na população", disse Aravinda Chakravati, do Instituto de Medicina Genética da Faculdade de Medicina da Universidade Johns Hopkins.

As equipes analisaram o material genético de famílias nas quais um casal sem sinais de autismo tenha dado à luz uma criança que desenvolve o distúrbio.

As mutações não são herdadas, ocorrendo espontaneamente durante a concepção ou perto dela. Grande parte das pessoas apresenta pelo menos uma mutação do tipo e, na grande maioria dos casos, ela é inofensiva.

Idade. Os estudos encontraram evidências de que o risco do surgimento de mutações raras aumento com a idade dos pais. Numa análise de 51 mutações, o grupo de Evan Eichler, professor de ciência genômica da Universidade de Washington, em Seattle, descobriu que a probabilidade de os problemas surgirem no DNA masculino era cinco vezes maior do que no feminino.

Nos pais com 35 anos ou mais, o risco de filhos com autismo é maior do que para aqueles na faixa dos 25 anos - e a idade parece afetar negativamente esse quadro. Isto oferece uma explicação para pesquisas anteriores que associaram pais mais velhos com um aumento na incidência de autismo: o sêmen de homens mais velhos está mais sujeito a pequenos problemas aleatórios que, em casos raros, podem afetar o desenvolvimento do cérebro.

Tudo isso parece sugerir que a busca por terapias será longa e o autismo pode representar uma ampla categoria de condições parecidas, porém distintas.

"O que temos é a ponta da ponta do iceberg", disse Eichler. "Mas creio que o mais importante é chegar a um acordo quanto ao nosso ponto de partida na busca daquilo que está por trás das mutações raras", afirmou.