Título: A mobilização dos bancos públicos para reduzir juros
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 06/04/2012, Economia, p. B2

O Banco Central, mesmo "sob nova direção", sempre alertou sobre os efeitos inflacionários do descompasso entre a oferta e a demanda domésticas. É estranho, portanto, que logo depois do pacote em favor da indústria, cujos efeitos sobre a oferta tardarão, anuncia-se que os bancos públicos aumentarão seus créditos para as pessoas físicas e, paralelamente, reduzirão suas taxas de juros, o que deverá ter um efeito imediato no aumento da demanda. Essa política, orientada pelo ministério da Fazenda, pode levar a três efeitos altamente negativos.

Primeiro, ao ser adotada num momento em que a inadimplência atinge seu maior valor, tenderá a aumentá-la com a ampliação da demanda doméstica, o que induzirá as instituições financeiras a maior cautela na distribuição dos créditos e a um aumento do spread.

Em segundo lugar, a elevação da demanda doméstica, neste momento, só pode ser atendida por mais importações, que serão realizadas com uma taxa cambial desvalorizada, o que significa que os bens importados, sob novo regime cambial, se tornarão mais caros. Deste modo, teremos um duplo fator inflacionário (demanda maior, bens mais caros), que poderá será fortalecido pelo sistema de desoneração das folhas de salários, o que em certos casos se traduzirá por um preço maior dos bens produzidos.

Finalmente, cabe questionar o uso dos bancos públicos para forçar a redução da taxa de juros e aumentar o volume de crédito neste momento. A história do Banco do Brasil está cheia de exemplos que comprovam como o uso de um banco público para forçar as instituições privadas a reduzirem o custo do dinheiro acaba por enfraquecer os próprios bancos públicos. Correm o sério risco de aumento da inadimplência, que pode levá-los a uma situação insustentável e a abrir a porta à concessão de créditos a partir apenas de critérios políticos, o que se verificou no passado.

O caso do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) é ainda mais escandaloso: vai receber do Tesouro mais R$ 45 bilhões, que elevam o orçamento paralelo dessa instituição a R$ 280 bilhões. O Tesouro capta recursos no mercado financeiro a um custo em torno de 12% para repassar tais recursos ao BNDES, que cobra 6%. Isso escapa da contabilidade pública, sem que se saiba quem assume a perda.

O descompasso entre a oferta de nossa indústria e a demanda doméstica vai continuar, mas com um aumento do risco inflacionário e das importações, elevando o déficit das transações correntes do balanço de pagamentos.