Título: Polícia prende 4 e crise faz Delta mudar diretoria
Autor: Rizzo, Alana; Mendes, Vannildo
Fonte: O Estado de São Paulo, 26/04/2012, Nacional, p. A4

Efeito cascata. Na esteira do escândalo Carlos Cachoeira, ex-diretor da empreiteira que tem negócios com governo é detido em Goiânia; Fernando Cavendish deixa a direção

A Polícia Civil e o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) prenderam ontem, durante a Operação Saint-Michel, o ex-diretor da Delta Construções Cláudio Abreu. A Justiça autorizou ainda a prisão do diretor da empreiteira em São Paulo, Heraldo Puccini Neto, mas ele não foi localizado pela polícia. Alvo da CPI, a construtora anunciou ontem a troca do comando da empresa (leia texto nesta página). A Operação Saint-Michel é um desdobramento da Operação Monte Carlo, que denunciou 81 pessoas, entre elas o contraventor Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira, e trouxe à tona um esquema de desvio de recursos públicos e financiamento de campanhas eleitorais capitaneado pela empreiteira.

Também foram presos ontem o vereador Wesley Clayton da Silva (PMDB), vice-presidente da Câmara Municipal de Anápolis (GO), Dagmar Alves e Valdir Reis, ex-assessor da Secretaria de Planejamento do governo do DF. Todos são acusados de envolvimento no esquema. Abreu foi transferido para a carceragem da Central de Polícia Especializada de Brasília, após fazer exame de corpo de delito, no fim da tarde de ontem. Além de quatro das cinco prisões decretadas, foram cumprdos seis mandados de busca e apreensão em Brasília, Goiânia, Anápolis e São Paulo. O objetivo da operação era desarticular um esquema de tráfico de influência, fraude em licitação e desvio público no sistema de bilhetagem eletrônica do Departamento de Transportes Urbanos (DFTrans). A empresa vencedora seria ligada à Delta Construções. Em 5 de abril, o Estado mostrou que o grupo de Cachoeira operou para dirigir licitação no DFTrans. “Embora a aludida sociedade empresária não tivesse expertise o suficiente para prestar o serviço, o plano seria comprar software da empresa coreana EB Card, ou fazer parceria com esta. Porém, os diálogos evidenciam que Carlinhos Cachoeira pretendia a todo custo que o serviço fosse prestado pela Delta, ante a estimativa de que o negócio movimentasse sessenta milhões”, afirma o despacho do juiz Felipe de Oliveira Kersten.

Segundo as investigações, Valdir teria recebido R$ 50 mil, a mando de Cachoeira, para trabalhar ativamente em favor da Delta na prestação dos serviços de bilhetagem. O próprio Valdir admitiria que já recebeu uma parte adiantada e que precisaria fazer o trabalho bem feito. Ele receberia R$ 10 mil todo mês até a concretização do negócio, além de um carro com gasolina. Wesley Clayton e Dagmar Duarte teriam atuado como lobistas no esquema, agendando reuniões com o diretor do DF- Trans e apresentando funcionários públicos que poderiam influenciar licitações. O advogado de Cláudio Abreu, Roberto Pagliuso, informou que a prisão foi desnecessária por- que o cliente vinha colaborando com as investigações, tem endereço fixo e não representa risco à ordem pública. “Vou tirar cópia dos autos para conhecer as acusações e entrar imediatamente com pedido de habeas corpus”, disse o defensor. “Não há justificativa para essa prisão. Ele tem comparecido a todos os depoi- mentos, não reagiu à prisão e tem colaborado de forma serena”, enfatizou. O advogado da Delta, Marcelo Souza, esteve na delegacia para negociar a apresentação de Puccini. O Estado não localizou os advogados de Wesley e de Dagmar. A Operação Saint-Michel bairro de Mônaco que, a exemplo de Monte Carlo, concentra cassinos e casas de jogos de azar – foi desencadeada pelo Núcleo de Combate a Organizações Criminosas (NCOC) do Ministério Público do DF, com auxílio da Polícia Civil do DF. Luxo. Condomínio fechado, o Ipês sempre foi um lugar tranquilo em Goiânia, mas agora tem ficado barulhento por causa de seus moradores mais ilustres. Foi lá que foi preso ontem Cláudio Abreu. Ele teve a casa revirada pela polícia e pelo Minis-tério Público, que buscavam documentos. Foi também nesse mesmo condomínio que o contraventor Carlinhos Cachoeira foi preso no fim de fevereiro, na casa que fora do governador Marconi Perillo.

Perillo, aliás, embora tenha à disposição o palácio do governo, onde morou de 1999 a 2006, também mora no Ipês, em uma casa construída em dois lotes e pela qual diz pagar aluguel. O governador e Abreu são vizinhos de condomínio de um irmão de Cachoeira, Júnior, que ali também reside. Mas não é tudo na lista de moradores ilustres. Moram ali o porta-voz efetivo do governo, Jayme Rincón, presidente da agência g oiana r esponsável pelas obras no Estado, a Agetop, e tesoureiro de Perillo na eleição de 2010, e ainda Alfredo Neto, superintendente do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) em Goiás. Ontem eram 10h da manhã quando se deflagrou a Operação Saint-Michel e Cláudio Abreu foi levado preso. / COLABOROU FERNANDO GALLO

Operação da PF inocenta Agnelo, afirma porta-voz

● O governo do Distrito Federal viu no resultado da operação Saint-Michel uma prova de que o governo Agnelo Queiroz não tem envolvimento com o esquema de Carlinhos Cachoeira. Em entrevista no Palácio Buriti, ao lado de vários auxiliares diretos de Agnelo, o porta-voz Ugo Braga alegou que nenhum funcionário do governo foi pego nessa operação nem na Monte Carlo, que desmontou o esquema de Cachoeira. “É mais uma prova de que não há envolvimento”, afirmou. “Cachoeira fez investidas para fazer negócios no DF e não conseguiu.” Ele disse ser “um erro absurdo” do Ministério Público mandar buscar Valdir Reis, ex-funcionário da Secretaria de Planejamento, no anexo I do palácio. “Ele nunca trabalhou no DFTrans e nunca teve contato comigo ou com qualquer dos outros diretores”, alegou Marco Campanella, do DF-Trans. Agnelo apareceu por alguns minutos no andar térreo para se despedir de Rui Falcão, com quem esteve pouco antes, mas se recusou a falar com os jornalistas. / LISANDRA PARAGUASSU