Título: A volta da inflação continua como uma ameaça atual
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 02/05/2012, Economia, p. B2

Era de prever que a elevação do salário mínimo em 14% teria efeito sobre os salários maiores que o mínimo. Em alguns casos, as remunerações no limiar do mínimo têm de ser revisadas, mas, agora, o aumento de 14% afetou de forma generalizada todos os assalariados, que consideram que também têm direito a um reajuste generoso.

Assim, na primeira onda de dissídios, já se observam aumentos reais maiores do que no ano passado. Partindo de uma inflação estimada em 5%, 35 mil operários da construção pesada conseguiram aumento real de 4,77% na Bahia; e, em São Paulo, 42 mil químicos conseguiram aumento real de 2,4%. Esses reajustes reais estão acima dos do ano passado e ocorrem em setores em que a demanda continua robusta, mas deverão servir de guia para dissídios de outras categorias.

Mesmo admitindo que a previsão do Ministério da Fazenda (de uma inflação de 4,5%) esteja ultrapassada, não há dúvida de que esse aumento real será transferido aos preços pagos pelos consumidores.

Há um outro fator, talvez mais capaz ainda de alimentar a inflação: a elevação de 21%, em um ano, da taxa cambial.

No ano passado, a indústria participou com 23,4% na formação do Produto Interno Bruto (PIB), mas as importações - que são deduzidas do valor adicionado - representaram 12,6% do PIB e neste ano continuam crescendo. Não há dúvida de que os produtos importados terão seus preços reajustados.

Diante dessa situação, parece oportuno perguntar por que o Banco Central continua intervindo no mercado cambial como comprador, quando já estamos enfrentando um fluxo cambial bastante forte e temos reservas internacionais bem confortáveis, cujo custo de formação, aliás, é muito elevado.

Se acrescentarmos a este quadro um aumento dos preços dos serviços, que não sofrem concorrência de importações, teremos uma nova perspectiva para a inflação, que está a merecer toda a atenção das autoridades monetárias e justifica uma pausa na redução da taxa de juros básica ou a implantação de medidas macroprudenciais para conter uma alta do consumo que o governo está promovendo na sua guerra contra as taxas de juros dos bancos privados.

O momento exige que se faça uma reflexão para examinar se a mudança na política monetária não foi excessivamente rápida e, mesmo reconhecendo que as taxas de juro ainda são muito elevadas, se o ritmo da correção não deveria ser mais lento.