Título: UE já tem plano se Grécia deixar euro
Autor: chade, Jamil
Fonte: O Estado de São Paulo, 19/05/2012, Economia, p. B10

Pela primeira vez, um alto funcionário da União Europeia confirma estar preparando um plano de emergência caso a Grécia deixe a zona do euro, no mesmo momento que a crise que começou em Atenas dá sinais de que pode atingir a Espanha e fugir do controle.

Ainda ontem, para agravar ainda mais a situação, a chanceler alemã Angela Merkel telefonou ao presidente grego e, segundo o governo de Atenas, sugeriu que o país realize um referendo sobre sua participação no euro, deixando furiosos os partidos por conta da ingerência e acusando Merkel de tratar a Grécia como um "protetorado". Berlim desmentiu.

Em mais um dia caótico na Europa, o comissário europeu de Economia, Olli Rehn, fez questão de anunciar que o único cenário com o qual se trabalha é o que inclui a Grécia dentro do bloco. Mas os esforços não foram suficientes para convencer os mercados de que as autoridades europeias estão pensando o impensável. Ontem, o risco de um contágio continuou a ficar explícito, principalmente na Espanha, que se transformou no novo epicentro dos problemas europeus e fez as bolsas mais uma vez desabarem.

Em declarações ao jornal belga De Standaard, o comissário de Comércio do bloco, Karel De Gucht, confirmou a existência dos planos de contingência, rompendo um tabu em Bruxelas. Há meses que o plano tem sido alvo de especulações. Mas a hipótese de uma saída da Grécia é considerado oficialmente como "blasfêmia". "Há um ano e meio, havia um risco de um efeito dominó", disse. "Mas hoje existe no Banco Central Europeu, assim como na Comissão Europeia, serviços trabalhando em cenários de emergência se a Grécia não der conta", completou, se recusando a dar detalhes do plano.

De Gucht não foi o único a falar desse tipo de plano. No Ministério de Finanças da Alemanha, uma porta-voz respondeu de forma enigmática quando foi questionada se Berlim tinha planos de contingência. "O governo alemão naturalmente tem responsabilidades perante seus cidadãos e está preparado para qualquer eventualidade", disse.

Referendo. Outro tabu quebrado ontem se refere à ingerência da Alemanha na política grega. Merkel telefonou para o presidente Carolos Papoulias para passar a mensagem de que Berlim não estaria forçando uma expulsão da Grécia. Mas cobrou uma atitude responsável e a adesão aos acordos. Segundo Atenas, a chanceler sugeriu que se fizesse um referendo no mesmo dia das eleições, em 17 de junho. A esperança alemã é que, com essa questão sendo colocada, a população direcione seu voto para partidos que apoiam os acordos com a Europa.

Na nota emitida pelo governo grego, Atenas afirma que teria explicado a Merkel que convocar um referendo não é da competência de um governo interino, mas apenas do Parlamento.

Há seis meses, o então primeiro-ministro grego George Papandreou apresentou justamente essa proposta, precipitando sua queda diante da ira de Merkel e também do então presidente francês Nicolas Sarkozy. Merkel teria qualificado Papandreou de "louco". Berlim se apressou em desmentir a versão oficial grega, insistindo que a ideia jamais foi discutida por Merkel.

Vontade grega. Ontem, pesquisas apontavam que 88% da população grega preferia ficar na zona do euro. Mas os gregos também exigem que a União Europeia reavalie as medidas de austeridade. Pouco mais da metade (54%) afirma que está disposta a fazer certos sacrifícios pelo euro. Mas, se não houver alternativa, optariam pelo dracma.

Por mais que Merkel tenha tentado apagar o fogo, sua sugestão caiu como uma bomba em Atenas. O líder conservador, Antonis Samaras, criticou Merkel. Alexis Tsipras, líder radical que lidera as pesquisas para as novas eleições, foi ainda mais duro. "Merkel se dirige aos líderes políticos gregos como se o país fosse um protetorado", declarou. Para o comunista, Aleka Papariga, Merkel está fazendo "chantagem".

A chanceler alemã não foi a única a deixar os gregos irritados. À rádio Europe 1, o ministro de Finanças da Alemanha, Wolfgang Schaeuble, insinuou que os partidos contrários à austeridade estão mentindo à população.

"Cabe aos políticos gregos explicar a realidade a seu povo e não fazer falsas promessas", disse. Segundo ele, a turbulência pode durar até 2014. "Em relação à crise de confiança do euro, veremos uma situação mais calma apenas em 12 a 24 meses", alertou.