Título: Alto custo de usinas de cana provoca fuga de investidor
Autor: Pereira, Renée
Fonte: O Estado de São Paulo, 21/05/2012, Economia, p. B7

Em quatro anos, a indústria brasileira de açúcar e álcool deixou de ser modelo de eficiência e produtividade e virou dor de cabeça de investidores e governo. De 2008 para cá, enquanto o custo de produção do açúcar saltou 60% (o do etanol subiu 46%), a produtividade agrícola caiu 13% - cerca de 11 toneladas por hectare. Com caixa debilitado, as empresas colocaram o pé no freio e os investimentos desapareceram. Pior: muitos estão revendo suas posições no País.

Se até 2008 havia uma corrida para entrar no setor, hoje tem empresário louco para sair. Numa rápida busca pelos classificados na internet, é possível encontrar uma extensa lista de usinas à venda. A oferta vai de pequenas e velhas unidades a grandes empreendimentos, com capacidade para moer até 9 milhões de toneladas. Os preços variam de R$ 100 milhões a R$ 2,5 bilhões. Fontes do setor garantem que mais de 20% das usinas da Região Centro-Sul estão à espera de comprador. Algumas são de empresas estrangeiras.

A multinacional British Petroleum (BP), por exemplo, já vendeu um projeto para a Bunge; a americana ADM quer se desfazer de uma unidade em Minas Gerais; e a espanhola Abengoa também estaria disposta a vender duas usinas. Já a indiana Renuka terá de receber R$ 185 milhões para honrar compromissos em suas unidades - entre eles com fornecedores. "Tem muito ativo à venda, mas não temos visto grandes negócios", diz o ex-presidente da União da Indústria da Cana de Açúcar (Unica), Eduardo Pereira de Carvalho, da Consultoria Expressão.

O inferno astral da indústria brasileira começou em 2008, quando as empresas foram surpreendidas pela crise internacional. Altamente endividadas no curto prazo e sem crédito para honrar os compromissos, muitas fecharam as portas. Outras estão até hoje tentando - a duras penas - se restabelecer no mercado. Estudo do Itaú BBA mostra que o setor tem cerca de R$ 42 bilhões em dívidas.

Além disso, quase um terço das empresas ainda tem dificuldade para fazer novos investimentos. Do total, 18% têm entre R$ 70 e R$ 100 de dívidas por tonelada de cana moída. Outras 17% estão alavancadas e precisam de alguma operação estratégica - leia-se injeção de dinheiro - para continuar funcionando. Nessas empresas, a dívida por tonelada de cana moída é superior a R$ 100. Entre as cinco piores, esse número chega a R$ 144,6. Na prática, isso significaria dizer que, para cada R$ 100 de faturamento, a empresa tem R$ 144 de empréstimos e financiamentos.

Com endividamento elevado, os usineiros cortaram todos os investimentos, seja em novas unidades ou na renovação dos canaviais. "De 2008 para cá, nenhum empresário decidiu fazer nova usina. Os projetos que estão sendo tirados do papel são antigos", diz o presidente da Associação das Indústrias Sucroenergéticas de Minas Gerais (Siamig), Luiz Custódio Cotta. Com isso, a oferta não consegue atender à demanda de açúcar e etanol no País.

Sem novos projetos e com condições climáticas desfavoráveis, a produção de cana encolheu 12% na Região Centro-Sul, responsável por 90% do mercado nacional. Para este ano, a expectativa é repetir os números da safra passada. Isso significa manter uma ociosidade entre 100 milhões e 150 milhões de toneladas de cana. "Esperávamos uma melhora na produtividade do setor, mas não deve haver grandes mudanças este ano", afirma o presidente interino da Unica, Antonio de Pádua Rodrigues.

Ele acredita que o dólar no nível atual pode dar um ligeiro fôlego ao produtor. Na avaliação de especialistas, no entanto, será preciso muito mais para reverter o quadro de desconfiança. No exterior, o aumento dos custos de produção do açúcar já entrou na pauta de discussão de grandes companhias. Na semana passada, o presidente da Bunge, Alberto Weisser, disse que o aumento do custo de produção do açúcar no Brasil tem levado muitas empresas a considerar a mudança para outros mercados, como a África. "Está mais barato produzir açúcar na Europa. Isso me preocupa. O Brasil está ficando muito caro."