Título: Unânime comissão veta indenizar Cabo Anselmo
Autor: Nossa, Leonencio
Fonte: O Estado de São Paulo, 23/05/2012, Nacional, p. A8

A Comissão de Anistia negou ontem, por unanimidade, pedido de indenização de José Anselmo dos Santos, 70 anos, que entrou para a história do Brasil como Cabo Anselmo, protagonista de uma revolta de marinheiros dias antes do golpe contra o presidente João Goulart e, depois, participante de reuniões de militantes de esquerda e agente duplo da repressão contra ex-colegas de farda e perseguidos políticos. Em reunião que começou à t arde e se estendeu até o início da noite, o relator do processo do ex- militar, Nilmário Miranda, afirmou em seu voto que Cabo Anselmo se tornou parte “explícita” do regime militar, atuando em ações que resultaram na tortura e morte de adversários da ditadura, em especial a própria companheira, Soledad Barret Viedma. Nilmário Miranda sustentou a versão de que Cabo Anselmo já era agente duplo nas agitações na Marinha em 1964. Uma das versões mais difundidas é a de que ele teria se tornado aliado do regime a partir de 1971, quando foi preso.

Sem reparação. O presidente da Comissão de Anistia, Paulo Abrão, ressaltou que o fato de Cabo Anselmo passar a atuar como um agente repressor tornava inviável, constitucionalmente, a reparação. A concessão da anistia, na avaliação de Abrão, não se deveria aplicar ao caso do agente duplo. “Abrir um precedente de uma anistia para um agente repressor é distorcer o instituto da reparação e os preceitos do Estado democrático de direito.” Durante o encontro, Genivalda Melo da Silva fez um relato sobre a morte do marido, o ex- marinheiro José Manoel da Silva, uma das vítimas do massacre do Sítio São Bento, em Abreu e Lima (PE), nos anos 1970. Num depoimento emocionado, ela acusou Anselmo de entregar José Manoel à repressão. “Eu perdoo de todo coração a ditadura, mas conceder anistia a Cabo Anselmo será uma vergonha para o País”, disse. Genivalda emocionou os 12 integrantes da comissão e a plateia, ao relatar que foi torturada e violentada sexualmente por agentes da repressão logo após a morte do marido.

Ela lamentou ainda que Cabo Anselmo não estava presente. O advogado dele, Juliano Brandi, tentou convencer a comissão de que o seu cliente foi obrigado a virar agente duplo. Ontem, os integrantes da Comissão de Anistia aprovaram a condição de anistiado e o pedido de pagamento de indenização de Ana Lúcia Valença de Santana Oliveira, que receberá R$ 100 mil, e Anivaldo Pereira Padilha, que receberá uma parcela de R$ 229 mil e benefício mensal de R$ 2.484. Anivaldo é pai do ministro da Saúde, Alexandre Padilha.

Porto Alegre marcará centros de tortura

A Prefeitura de Porto Alegre e o Movimento de Justiça e Direitos Humanos assinaram convênio para identificar, com placas, locais que abrigaram centros de detenção e tortura no regime militar. A iniciativa faz parte do projeto Marcas da Memória, destinado a estimular o conhecimento sobre o período histórico. Em São Paulo, o Tribunal de Justiça adiou o julgamento do recurso do coronel da reserva Carlos Brilhante Ustra contra a sentença de primeira instânciana qual foi reconhecido como responsável por torturas. Após ouvir uma longa exposição do advogado Fábio Konder Comparato, que defende a família Teles, autora da ação contra o coronel, o relator pediu mais tempo para examinar os sete volumes que compõe os autos do processo. A ação tramita desde 2005. / ELDER OGLIARI e ROLDÃO ARRUDA