Título: Cúpula da UE termina sem consenso
Autor: Netto, Andrei
Fonte: O Estado de São Paulo, 24/05/2012, Economia, p. B10

Líderes discutem medidas de estímulo ao crescimento, mas única certeza é que divergências entre Hollande e Merkel estão mais visíveis Líderes dos 27 países da União Europeia invadiram a madrugada de hoje reunidos, em Bruxelas, sem conseguirem fechar um novo acordo para reduzir a instabilidade sobre a zona do euro - mais do que nunca ameaçada de desintegração.

Em uma cúpula extraordinária, chefes de Estado e de governo analisaram as propostas apresentadas pelo novo presidente da França, François Hollande, que prega a inclusão de medidas de estímulo ao crescimento e a mutualização das dívidas futuras do bloco por meio da criação de eurobônus, títulos soberanos da Europa.

Mesmo com o nervosismo crescente dos investidores, o consenso ficou distante.

A reunião marcou a estreia de Hollande em Bruxelas. E o início não poderia ser mais tenso, já que os mercados financeiros viveram mais um dia de fortes pressões. Minutos antes do início da cúpula, o euro atingiu seu mais baixo valor desde o primeiro semestre de 2010, valendo US$ 1,26.

Nas bolsas de valores, o pessimismo dos investidores derrubou os mercados. Em Londres, o índice FTSE 100 caiu 2,53%. Em Paris, a queda do CAC40 foi de 2,62% e em Frankfurt, 2,33%. Na Espanha e na Itália, os tombos foram superiores a 3%.

Parte do pessimismo foi causado pelos rumores crescentes de que a Europa já começa a se preparar para o desligamento da Grécia da zona do euro, em caso de resultado adverso nas eleições parlamentares de 17 de junho.

Segundo a agência Reuters, na segunda-feira o Eurogrupo, o fórum de ministros de Finanças da zona do euro, deu ordem para a elaboração de modelos para verificar o impacto da eventual falência grega e para a criação de planos nacionais de contingência da crise. O Fundo Europeu de estabilidade Financeira (Feef) teria sido mobilizado.

O ex-primeiro-ministro da Grécia Lucas Papademos afirmou ao Wall Street Journal que não exclui a hipótese de que os cenários estejam sendo elaborados. Mas diversos líderes políticos preferiram desmentir a existência da estratégia.

"Não estou informado de nenhuma simulação sobre os efeitos de uma saída da zona do euro", alegou François Hollande. "No que diz respeito à França, não estamos imaginando essa hipótese, porque eu privilegio a permanência da Grécia na zona do euro."

Só propostas. Em meio a esse clima de tensão, a cúpula de Bruxelas não trouxe decisões efetivas, que são esperadas para junho. Paris defendeu também a ampliação do mandato do Banco Central Europeu (BCE), que além do controle da inflação teria um papel ativo no estímulo ao crescimento e no controle da liquidez do sistema financeiro. Outra proposta previa alterações do emprego dos recursos do Feef e de seu sucessor. O fundo contaria com uma "licença bancária" para auxiliar os países em dificuldade, como Grécia, Portugal, Irlanda e Espanha.

Hollande pregou ainda o aumento de recursos do Banco Europeu de Investimentos (BEI), instituição que hoje dispõe de € 50 bilhões e passaria a contar com mais € 10 bilhões. Por último, foi discutida a criação de um imposto sobre transações financeiras em nível continental.

O primeiro-ministro do Reino Unido, David Cameron, porém, já anunciou que vetará a iniciativa.

Resistência. As medidas propostas pela França tinham o apoio da Comissão Europeia, mas enfrentaram mais uma vez resistências de um bloco de países formado por Alemanha, Áustria, Finlândia e, em menor grau, a Holanda. O presidente francês, por outro lado, contou com o apoio da maior parte dos países do sul, inclusive o do prestigiado primeiro-ministro da Itália, Mario Monti.

As divergências impediram que se chegasse a um acordo ontem. O ponto mais delicado foi a mutualização das dívidas. Minutos antes da renegociação, a chanceler alemã, Angela Merkel, já havia descartado a iniciativa. "Os eurobônus não são uma contribuição para o crescimento", justificou.

"Alguns países foram totalmente hostis, outros aceitaram em longo termo, e outros em uma visão mais próxima", disse Hollande. "Mas eu não fui o único a sustentar os eurobônus."

O objetivo do governo francês é seguir debatendo até junho, prazo para tentar dobrar a resistência de Merkel. "A chanceler da Alemanha considera que os eurobônus são um ponto final. Nós consideramos que eles devem ser um ponto de partida", explicou. "Esse debate vai continuar. Ninguém esperava que houvesse decisão aqui."