Título: Grampo mostra que Demóstenes temia ‘flagra’ de elo com Delta
Autor: Rizzo, Alana
Fonte: O Estado de São Paulo, 29/05/2012, Nacional, p. A8

Escutas telefônicas da Polícia Federal mostram a preocupação do senador Demóstenes Torres (ex- DEM, sem partido) em esconder sua relação com a Delta Construções. Segundo a PF, o parlamentar era uma espécie de “sócio oculto” da empresa. Em 8 de maio de 2011, o senador liga para Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira, e menciona uma possível doação legal que teria recebido da empreiteira nas eleições de 2010 e demonstra estranhamento e preocupação. “Eu acho que eles fizeram uma doação oficial para mim”, diz, re- ferindo-se à construtora Delta, de acordo com relatório da PF. O contraventor tranquiliza o senador: “Fez não. Você tá doido?!” Demóstenes então completa: “É. Fez não, né? O João Gualberto que me ligou aqui. Se não fez é melhor ainda. Vou dar uma checada nisso.” Cachoeira volta a negar a doação. “Fez não, moço.” Minutos depois, Cachoeira liga para o senador. “Foi uma outra empresa.” Demóstenes comemora. “Ok. Beleza. Maravilha.” A apreensão é tanta que o contraventor liga novamente após dois minutos. “É uma usina de álcool. Uma usina não sei o quê”, diz. Aliviado, o senador responde que agora é hora de trabalhar para segurar qualquer investigação no Congresso. “ A semana vai ser quente, mas depois esfria.” A prestação de contas apresentada pelo senador ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) mostra que ele recebeu R$ 390 mil de cinco usinas de álcool. A conversa ocorreu durante uma crise envolvendo a empreiteira após reportagem da revista Veja, que abordava contratos de consultoria da Delta Construções com o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu (PT).

Os parlamentares da oposição cobravam a presença de Fernando Cavendish, então presidente da Delta, no Congresso. As escutas da PF mostram que Demóstenes cumpriu a promessa e atrapalhou o andamento das apurações e preservou a Delta, a pedido do contraventor. Depois de conversar com o senador, Cachoeira liga para Cláudio Abreu, então diretor da Delta Centro-Oeste, e passa orientações. “Tá triste, Cláudio? Levanta a cabeça. Passa. Demóstenes ligou e falou que a imprensa nacional está atrás dele. Fala para o Fernando (Cavendish) que o Álvaro Dias (senador do PSDB) vai pedir a convocação dele, mas que não tem. O máximo que sair é convite. Ele vai se quiser, (fala) que é para ele não se preocupar.” E completa: “A oposição vai subir em cima. Ele (Demóstenes) quer que a Delta se adiante. Põe uma nota amanhã cedo, na parte da manhã. O mais rápido possível para não dar muita moral para esse fato. Não alastrar”.

A relação entre o contraventor e a empreiteira nacional está na pauta da CPI do Cachoeira. Governistas tentam barrar requerimentos que tratem da quebra de sigilo da Delta nacional e sugerem que as investigações devem ficar restritas ao Centro- Oeste. Posição contrária aos parlamentares da oposição, que tentam ampliar a apuração, atingindo o governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral (PMDB), e outros políticos da base aliada do governo federal.

Cassação. Hoje, Demóstenes prestará depoimento no Conselho de Ética do Senado para apresentar sua versão. O script de sua defesa está traçado: a intenção é destacar sua biografia técnica, contribuições nas comissões temáticas, passando ao largo das declarações polêmicas. O senador pretende, ainda, ressaltar os votos obtidos em Goiás e se deter nos argumentos levantados pelo relator do caso na comissão, senador Humberto Costa (PT-PE).