Título: Crise dos salários afasta presidente do TRE-SP
Autor: Macedo, Fausto
Fonte: O Estado de São Paulo, 31/05/2012, Nacional, p. A10

Por 13 votos contra 12, o Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) decretou ontem o afastamento cautelar do desembargador Alceu Penteado Navarro de suas funções jurisdicionais e da presidência do Tribunal Regional Eleitoral do Estado (TRE-SP), o maior do País, com um quadro de 30,6 milhões de eleitores. O revés imposto a Navarro é histórico. Jamais o TJ ha- via determinado a saída de um mandatário máximo da corte eleitoral. “Vamos ter este ano as eleições municipais, que são a base de todas as outras eleições superiores. Nessas condições não pode recair a mais tênue dúvida sobre os deveres de probidade do presidente do TRE, que deve manter conduta irrepreensível”, advertiu o desembargador Ivan Sartori, presidente do TJ, relator nato da investigação sobre o capítulo mais emblemático da toga paulista – o escândalo dos pagamentos milionários concedidos a Navarro e a outros quatro magistrados, entre 2008 e 2010.

Navarro é desembargador de carreira do TJ. Aos 67 anos, 40 dos quais na magistratura paulista, foi indicado pelo próprio Órgão Especial para o TRE, que o escolheu em dezembro para ocupar o cargo de guardião-mor do processo eleitoral. Naquele período em que os créditos antecipados caíram em sua conta, Navarro presidia a Comissão de Orçamento do TJ. Ele recebeu R$ 640,3 mil. Dois outros desembargadores, Fábio Gouvêa (R$ 713,2 mil) e Vianna Cotrim (R$ 631,6 mil), faziam parte do comitê que, segundo Ivan Sartori, detinha poderes plenos para liberar os desembolsos. As gestões de dois ex-presidentes do TJ, Vallim Bellocchi (R$ 1,44 milhão) e Vianna Santos (R$ 1,26 milhão), são citadas – Vianna já morreu. “Aqui existia uma administração paralela”, acusa Sartori, que apontou “fortes indícios de conluio para a prática de uma série de ilícitos”. Foi aberto processo disciplinar contra quatro. Bellocchi, que deixou o TJ em 2010, pode ter cassada a aposentadoria. A tarde no colegiado de cúpula do TJ, formado por 25 desembargadores, inclusive seu presidente, foi marcada por uma disputa renhida de ideias e argumentos jurídicos acerca da competência da corte para derrubar o presidente do TRE, de âmbito federal.

Sartori abriu a sessão e logo disse a que veio: propôs instauração de procedimento administrativo disciplinar contra Navarro e seu alijamento do cargo de presidente do TRE. Na atmosfera sisuda do plenário, palco de tantas tradições da magistratura, um homem desfilava entre advogados renomados e jurisconsultos. Era Oscar Maroni, empresário da noite, dono da Bahamas, a famosa boate de Moema, na zona sul, interditada desde 2007. Ele aguardava ansiosamente o julgamento de demanda de seu interesse.

Atestado. Ao mesmo tempo que pôs Navarro para fora do TRE, o Órgão Especial poupou Gouvêa e Cotrim, mantendo-os em suas atividades. Mas a ala radical do colegiado exibiu armas pesadas. “Este Órgão Especial já afastou juízes por comportamento inadequado, mas que não cometeram nenhum ato de desonestidade”, asseverou o desembargador Guilherme Strenger, do núcleo duro da corte, que pediu a degola de todos. “Eu afasto os três”, emendou o desembargador Ruy Coppola, da mesma linhagem. “Conceber a permanência (dos desembargadores), com o devido respeito, é passar atestado de idiota. É aquele negócio: farinha pouca, meu pirão primeiro.” Luís Soares de Mello, aliado de Strenger e Coppola, disse. “Estamos todos feridos de morte, com o sangramento contínuo das restantes reservas morais deste tribunal.”

Para alcançar sua meta, Sartori foi estratégico. Inicialmente, propôs a seus pares que também a Gouvêa e a Cotrim fosse aplicada a sanção que golpeou Navarro– a suspensão das funções. Mas, durante as manifestações, desembargadores ponderaram que não fazia sentido a medida porque o processo disciplinar estava sendo inaugurado – longe, portanto, do julgamento – e que os magistrados não teriam como travar a fase de instrução da demanda de caráter administrativo, vez que as provas documentais já foram amealhadas na fase preliminar da apuração.

Sartori refez seu libelo – então, poupou Gouvêa e Cotrim e votou pela permanência de ambos em seus postos, mas foi imperativo ao mirar Navarro. “Ele não pode permanecer na presidência do TRE. A situação é delicada, gravíssima. (Navarro) Não merece e não pode estar lá.”

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