Título: Economia não vai reagir muito apenas com corte de juro
Autor: Fordelone, Yolanda
Fonte: O Estado de São Paulo, 31/05/2012, Economia, p. B4

José Márcio Camargo, economista da gestora Opus, no Rio, prevê mais um corte de 0,5 ponto porcentual na próxima reunião do Copom, mas acha que a marcha lenta da economia é problema de perda de competitividade.

O que o sr. achou da decisão?

Veio de acordo com a nossa previsão. Esperamos mais um corte de 0,5 na próxima reunião. Existem várias razões para crermos nisso. A comunicação do Banco Central está claramente apontando nessa direção, e o BC está se mostrando bastante preocupado com a conjuntura internacional. Aliás, com razão, porque a situação está se deteriorando muito rapidamente. Isso tende a gerar um espaço para reduzir mais os juros. Por outro lado, o BC sinalizou parcimônia, e já reduziu bastante os juros nos últimos oito, nove meses. O terceiro fator importante é que a economia brasileira reagiu muito pouco à queda dos juros e às políticas para tentar aumentar crédito.

Por quê?

Eu sempre fui e continuo pessimista em relação à reação da economia brasileira a essas medidas. Acho que, em grande parte, o problema da economia brasileira está ligado à competitividade e não à demanda. Ou seja, reduzir juros pode ser importante, pode dar algum efeito. Tentar aumentar crédito pode ter algum efeito. Mas é fundamental ter políticas do lado dos ganhos de competitividade.

Qual a sua interpretação do comunicado do Copom?

A expressão "dando seguimento" é um sinal de que devem cortar mais uma vez. Já a expressão "neste momento" indica, na minha avaliação, que eles podem mudar se a situação mudar.

A Selic atingiu seu nível mais baixo. É um momento histórico?

Em nenhum momento nos últimos 50 anos o mundo esteve numa situação tão delicada e complicada como hoje. Os Estados Unidos crescem muito pouco, a Europa está num grau de incerteza enorme, impossível saber exatamente o que vai acontecer lá. A China desacelera muito forte. Cerca de 60% da economia mundial está claramente vivendo um período difícil. É natural que isso se reflita de alguma forma no Brasil. Os juros no mundo estão em nível muito baixo, em alguns casos próximos de zero, e uma boa parte do mundo está com juro real negativo. Acho que no Brasil é um processo. Há uma tendência de redução do juro desde a estabilização, e estamos assistindo à continuação desse processo em um mundo ainda muito recessivo. O Brasil está importando pressões deflacionárias neste momento. Não vejo como algo excepcional.

A inflação deixou de preocupar?

Não. Estamos importando deflação e ainda assim estamos com uma inflação de 5% ao ano, com a economia crescendo um pouco mais de 2%. Ou seja, o cenário não é tranquilo. Nós não temos pressão inflacionária forte porque a economia mundial está crescendo perto de zero e a economia brasileira está crescendo 2,5% ao ano. Então, tem razões estruturais para que a inflação esteja relativamente baixa, e ainda assim, enquanto nossos parceiros comerciais estão com inflação entre 2% e 3%, o Brasil está com inflação de 5% ao ano.

O sr. citou o problema da competitividade. Poderia explicar melhor?

Uma das coisas que me preocupam mais é o fato de os salários estarem aumentando a uma taxa muito acima dos ganhos de produtividade, o que está gerando um aumento nos custos unitários do trabalho, e fazendo com que o setor industrial se torne cada vez menos competitivo em relação ao resto do mundo