Título: Espanha pede socorro aos bancos, mas alerta que país não pode ser resgatado
Autor: Netto, Andrei
Fonte: O Estado de São Paulo, 06/06/2012, Economia, p. B10

Pressionado pelo aumento da crise de liquidez de seu sistema financeiro, o governo da Espanha lançou nesta terça-feira, 5, um SOS à Europa, admitindo que precisa de ajuda externa urgente para salvar seus bancos do risco de falência. A admissão, feita pelo ministro de Finanças, Cristóbal Montoro, teve o efeito de um tremor de terras em Bruxelas, Berlim e Paris. O executivo admitiu que seu país "não tem mais acesso aos mercados financeiros", pediu solidariedade para recapitalizar suas instituições e advertiu: "A Espanha não é resgatável".

As declarações deixaram claro que a crise das dívidas na Europa está ganhando um novo e mais grave capítulo, por já contaminar o sistema financeiro da quarta maior economia da zona do euro. Em entrevista concedida pela manhã à rádio Onda Cero, Montoro comentou a escalada dos juros cobrados no mercado de dívidas soberanas pelos papéis emitidos pelo tesouro de Madri. "O prêmio de risco significa que a Espanha não tem acesso aos mercados financeiros", reconheceu. Na prática, o ministro admitiu que o país não tem como emitir mais bônus do tesouro sob pena de aumentar o endividamento e pagar um custo insustentável, que supera os 6% para papeis com validade de 10 anos.

Diante desse cenário, a solução para recapitalizar seu sistema financeiro é solicitar a ajuda da União Europeia. Analistas estimam que serão necessários entre € 40 bilhões e € 50 bilhões para socorrer as instituições. Só para o Bankia, o quarto maior banco privado do país, serão necessários € 19 bilhões. O valor total é equivalente a 5% do Produto Interno Bruto (PIB) do país, inferior aos planos de resgate concedidos à Grécia, Irlanda e Portugal.

Montoro não comentou esses números, mas deixou claro que espera socorro da União Europeia. "É muito importante que as instituições europeias se abram e nos ajudem a superar este montante, que não é astronômico", argumentou. Uma das opções em discussão é a intervenção do Banco Central Europeu (BCE) ou do Fundo Europeu de Estabilidade Financeira (FEEF) no mercado de obrigações soberanas. A medida reduziria a pressão dos juros sobre os títulos espanhóis, o que permitiria ao governo de Mariano Rajoy socorrer sozinho seus bancos. Outra possibilidade é a recapitalização pelo futuro Mecanismo Europeu de Estabilidade (MES), que substituirá o FEEF em julho e contará com mais de € 700 bilhões em caixa. Para tanto, porém, seria necessário alterar o recém elaborado estatuto do mecanismo, criando uma "união bancária" na Europa. A união bancária permitiria recapitalizar diretamente os bancos, sem passar pelos estados, sustentou Montoro. "Esperamos que (a proposta) esteja madura antes do final do mês", disse ele, referindo-se à próxima cúpula da UE, em Bruxelas.

Essa proposta vem sendo discutida pelos líderes europeus, mas mais uma vez tem a oposição da Alemanha. Isso porque a chanceler Angela Merkel não aceitaria que os bancos de um país recebam recursos de contribuintes alemães sem que haja contrapartidas, como reformas estruturais e planos de austeridade - como os exigidos dos demais países socorridos até aqui. Ainda assim, em Bruxelas estuda a hipótese. Hoje, Olli Rehn, comissário europeu de Finanças, classificou o projeto de "opção séria" para "romper o vínculo entre os Estados e os bancos".

Para Montoro, o SOS lançado em relação ao sistema financeiro é ainda mais urgente para evitar o agravamento da crise na Espanha, país que responde por 18% do PIB da UE - contra 6% de Grécia, Irlanda e Portugal. Segundo ele, resgatando o sistema financeiro evita-se o pior, porque, por seu tamanho, o país em si não poderá ser salvo. "Os homens de preto não vão vir à Espanha, porque (o país) não é resgatável", disse Montoro, referindo-se aos executivos da troica - UE, BCE e FMI. A Espanha representa um risco sistêmico muito superior ao de Atenas, por exemplo. Só os bancos da Alemanha dispõem de € 146 bilhões em títulos da dívida madrilenha.

Horas após a entrevista de seu ministro, o premiê Mariano Rajoy confirmou ao Senado que a economia do país vive um momento grave. Em pronunciamento aos parlamentares, o chefe de governo se uniu ao coro em favor da criação de eurobônus - os títulos da dívida soberana da UE. "A Europa precisa apoiar quem está em dificuldades e necessita integração fiscal, com uma autoridade fiscal e uma união bancária com euronônus, com um supervisor bancário e com um fundo de garantia dos depósitos europeus", enumerou.

Agora, líderes políticos de quatro das cinco maiores economias da Europa - França, Reino Unido, Itália e Espanha - estão pressionando pela adoção da proposta do presidente francês, François Hollande, de mutualização das dívidas futuras do bloco. A Alemanha de Angela Merkel, primeira economia do bloco, é contrária.