Título: Decisão não surpreende, mas também não resolve
Autor: Decloedt, Cynthia ; Castro, Fabrício de
Fonte: O Estado de São Paulo, 15/06/2012, Economia, p. B3

A decisão do governo de cancelar o imposto sobre empréstimos externos acima de 720 dias não surpreende, não atrapalha e não resolve. Como se recorda, essa medida foi tomada no início deste ano, quando o Brasil estava sendo inundado por uma liquidez amazônica que forçou uma valorização do real para níveis abaixo de R$ 1,60.

A ideia então era restringir a exposição da indústria brasileira à concorrência internacional, aliviando o BC da tarefa onerosa de acumular reservas, ainda que isso pudesse acarretar algum impacto negativo sobre a inflação. Como complemento a outras medidas do mesmo naipe, acabou funcionando. Em relação a 14 de junho do ano passado, a desvalorização cambial cravou ontem 30%.

Deu tão certo, que parece agora estar dando errado. Nem tanto pelo temido impacto sobre a inflação, algo amortecido pelo estancamento da atividade da economia, mas por uma agora revelada preocupação com o fluxo de capitais. Alguém certamente se lembrará da manjada citação de Keynes - "Quando as circunstâncias mudam, eu mudo de opinião" -, mas o fato é que essa alteração traz, pelo menos, dois inconvenientes.

Em primeiro lugar, ela tem tudo para ser inócua. O fluxo de capitais para economias emergentes foi revertido não porque alguns países colocaram barreiras, mas porque o mundo se transformou em um lugar muito perigoso. Com dúvidas sobre a desaceleração da economia chinesa e, principalmente, se vai ser a Grécia, a Alemanha, todos juntos ou ninguém a deixar o euro, o mercado de capitais reduziu sua exposição a risco e se recolheu aos grandes centros financeiros internacionais.

Por via das dúvidas, é melhor esperar o fim do mundo em Londres ou Nova York. Assim, na analogia rural do professor Delfim Netto, é possível puxar uma vaca por uma corda, mas ela não anda para trás se a corda for empurrada. Em outras palavras, o fim do imposto não trará novos recursos enquanto o cenário global não clarear.

O segundo inconveniente é que o governo reforça a impressão de que está tomado por uma feérica hiperatividade legiferante. Nestes últimos meses, o painel de controle da política econômica acende luzes, apita e dispara alarmes com frequência estonteante, o que em nada contribui para mitigar as incertezas que reprimem a retomada dos investimentos.