Título: Brasil assume comando de negociações e promete agir para superar impasses
Autor: Escobar, Herton
Fonte: O Estado de São Paulo, 16/06/2012, Vida, p. A22

Ambiente. Divergências entre países desenvolvidos e pobres na Rio+20 voltaram a prevalecer sobre vários temas, especialmente no que diz respeito aos chamados "meios de implementação", que tratam da transferência de recursos financeiros e tecnológicos

O Brasil assume hoje o comando das negociações na Rio+20, prometendo pulso firme para garantir que todos os impasses diplomáticos serão resolvidos antes do início da cúpula de alto nível, no dia 20, quando ministros e chefes de Estado deverão aprovar o documento final da conferência. "A responsabilidade (agora) é do Brasil", disse ontem o embaixador Luiz Alberto Figueiredo Machado, chefe da delegação brasileira. Todas as mesas de negociação a partir de agora, segundo ele, serão convocadas e coordenadas por diplomatas brasileiros.

Ontem foi o último dia de reunião do Comitê Preparatório (PrepCom), que deveria, a princípio, ter produzido o rascunho final do documento. Divergências entre países ricos e pobres, porém, prevaleceram sobre vários temas - em especial, no que diz respeito aos chamados "meios de implementação", que tratam da transferência de recursos financeiros e tecnológicos para países em desenvolvimento, como forma de auxiliar na transição para um modelo de economia verde.

A arquitetura de negociação entre hoje e terça-feira deverá ser semelhante à usada nos três dias da PrepCom, diz Figueiredo, com grupos de trabalho dedicados à discussão de temas específicos e consultas informais entre representantes-chave. Em entrevista coletiva à imprensa ontem à tarde, porém, ele deixou entendido que o Brasil conduzirá as negociações com pulso firme e o novo prazo para fechar o documento é o dia 19.

"Na prática vamos imprimir uma dinâmica um pouco diferente, já que estamos na etapa final de negociação", disse o diplomata. Segundo ele, só será discutido agora o que é imprescindível, sem preocupação com detalhes que muitas vezes consomem horas de negociação. "Não importa se o verbo não é o ideal ou se a frase não ficou bonita. Não é mais hora para isso", disse. "Não temos intenção de levar nenhum tema aberto aos chefes de Estado."

As negociações continuavam intensas ontem, e a expectativa era de que elas continuariam assim até a madrugada. "Isso é normal", disse Figueiredo. "O número de horas de sono nessas conferências é reduzido."

"O sentimento geral é de que nosso maior inimigo agora é o tempo", disse, ainda no início da tarde, o indiano Nikhil Seth, um dos porta-vozes da ONU. O texto que está em negociação trata de vários temas ambientais, sociais e econômicos considerados essenciais para colocar o planeta no rumo do desenvolvimento sustentável, como gestão da água, redução da pobreza, segurança alimentar, energias limpas e modelos econômicos verdes.

Recursos. O grande dilema é como financiar a implementação desses modelos, para que as eventuais decisões da conferência não fiquem apenas no papel - como ocorreu com vários dos compromissos firmados na Rio-92, realizada no mesmo centro de conferências 20 anos atrás. Uma cerimônia ontem marcou o aniversário do encontro, na época chamado de Cúpula da Terra, ou Eco-92.

"Isso pede uma celebração, mas, francamente, não há muito o que comemorar", lamentou o canadense Maurice Strong, de 83 anos, que foi o secretário-geral da Rio-92. Segundo ele, apesar dos acordos firmados em 1992, o mundo hoje está mais distante da sustentabilidade do que 20 anos atrás. Ele elogiou as posições de Brasil e China e criticou os países desenvolvidos por não cumprir seus compromissos - com uma referência especial ao Canadá. "Não estou nada satisfeito com o papel do meu país."

O senador Fernando Collor, presidente em 1992, também participou do evento. "Com o Brasil no comando das negociações tenho certeza de que podemos alcançar o consenso necessário", disse. / COLABORARAM FERNANDO DANTAS E FELIPE WERNECK