Título: Escolas acusam Enem de deixar de fornecer dado que ampliava avaliação
Autor: Saldaña, Paulo
Fonte: O Estado de São Paulo, 26/06/2012, Vida, p. A19

Diretores de colégios dizem que desde 2009 não recebem mais os boletins que mostravam o desempenho nas competências avaliadas e isso os impede de usar o resultado do exame como um parâmetro para melhorar os seus cursos

Depois que o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) foi transformado em vestibular, em 2009, as escolas deixaram de receber boletins que mostravam o desempenho pelas competências avaliadas no exame. Os diretores das escolas reclamam e apontam que não têm mais ferramentas para usar o resultado do Enem como parâmetro para melhorar seus cursos.

Para os diretores, o Enem perdeu a função de avaliação do último ciclo da educação básica. Antes, as escolas podiam receber um boletim que trazia o desempenho dos alunos nas cinco competências da prova objetiva e nas variáveis que compõem a avaliação da redação. As competências fazem parte da matriz de referência do Enem – eixos cognitivos comuns a todas as áreas.

Mesmo considerado importante pelas escolas, o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep), braço do Ministério da Educação (MEC) responsável pelo Enem, abandonou os boletins a partir de 2009. "Se a intenção é induzir a melhoria do ensino pelo Enem, precisa aproveitar melhor os resultados", diz o diretor do Colégio Equipe, Luis Marcio Barbosa.

O diretor afirma que o antigo boletim oferecia inúmeras possibilidades de uso pedagógico. "Podíamos levantar mais hipóteses, ver que em uma determinada habilidade os alunos foram melhores que em outras, que precisamos trabalhar melhor o texto argumentativo, a análise de interpretação de gráficos. Coisas que apenas uma média da escola não proporciona."

Rankings. Atualmente, o Inep divulga apenas a média das escolas nas notas das provas objetivas – levando em conta a correção pela Teoria de Resposta ao Item (TRI) – e na redação. São dessas informações que saem os rankings de escolas, criticados por especialistas e diretores.

"Com essa informação, só consigo ver a média da minha escola e saber se está em primeiro, décimo ou último. Mas, do ponto de vista de interferência pedagógica, é limitado", diz a diretora do Colégio Móbile, Maria Helena Bresser.

Maria Helena também afirma que, mesmo que o cálculo das notas do aluno use a TRI (em que o número de acertos não é a única variável da nota), seria importante para a escola a análise de cada questão da prova. "Podíamos ver qual questão teve mais erro na escola e pensar, por exemplo, se meus alunos não sabem analisar gráficos."

A criação do Enem, em 1998, trouxe para o centro do debate um tipo de avaliação que mede habilidades e competências. Esse conceito foi mantido mesmo após a adoção do exame como vestibular. A pretensão do MEC sempre foi usar o Enem como paradigma do ensino médio.

Para a diretora do Colégio Sidarta, Claudia Siqueira, a falta do boletim e de mais informações dificulta. "A escola trabalha com conteúdo e existe essa diferença com instrumentos avaliativos, como o Enem colocou", diz. "Facilitaria se soubéssemos a performance dos alunos."

Segundo a diretora do Albert Sabin, Gisele Magnossão, a TRI também dificulta a leitura para as escolas e os alunos. "A gente não sabe dizer se eles foram melhor de um ano para o outro. Antigamente a gente conseguia."

Mudanças. Os alunos também recebiam um boletim mais detalhado, com o desempenho por competência. Para o professor da USP Ocimar Alavarse, isso tem pouco impacto. "Para as escolas, os boletins podem ser importantes porque oferecem uma leitura em escala. Mas para alunos não faz muito sentido."

O Inep promete fornecer neste ano para as escolas uma nova interpretação da escala de proficiência (que reflete as competências) do Enem. O Inep, afirma que está "estudando novas formas de auxiliar as escolas em seus processos de análise e avaliação dos resultados".

‘Microdados’ do Enem são de difícil acesso para escolas

Além do ranking por escola, o Inep coloca em seu site os chamados “microdados” do Enem. O conjunto de informações possibilita diversos recortes, como analisar os acertos por questão dos candidatos, por exemplo. O instituto ligado ao MEC aponta que os dados auxiliam as instituições em seu processo de avaliação, mas, na prática, quase nenhuma escola consegue utilizá-lo. O arquivo tem 5 gigas, equiva-lente a 5 bilhões de letras. Usá-lo requer conhecimento em estatística. Algumas escolas particulares colocam equipes de tecnologia para destrinchar as informações, mas, na rede pública, os dados são desconhecidos. A Escola Estadual Carlos Cattony, de Parelheiros, zona sul de São Paulo, teve uma boa nota no Enem 2010. Adireção trabalha no plano de gestão e fez por con-ta própria uma pesquisa socioeconômica para basear mudanças. A iniciativa é boa, mas o trabalho é dobrado: isso está nos microdados. “Se tivéssemos essas informações, ajudaria para facilitar os planos da escola. Temos de conhecer para atuar”, informou a direção da escola./ P.S.