Título: As medidas são corretas, mas não são suficientes
Autor: Nakagawa, Fernando
Fonte: O Estado de São Paulo, 04/07/2012, Economia, p. B3
Para economista, tributos travam investimentos e é preciso avançar na questão da infraestrutura, logística e energia
A correção dos estoques em ritmo mais lento do que o esperado tem impedido uma reação da indústria aos estímulos adotados pelo governo para reaquecer a economia, segundo o economista Paulo Levy, técnico de Planejamento e Pesquisa do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). As medidas tomadas pelo governo ainda não atacam os problemas estruturais do setor, que travam a competitividade dos manufaturados brasileiros apesar dos ventos mais favoráveis do câmbio. Embora seja esperada alguma recuperação na produção no segundo semestre, dificilmente a indústria escapará de fechar 2012 em território negativo.
O que está faltando para a recuperação industrial?
Há diversas razões para esse resultado ainda fraco. Em primeiro lugar, houve uma desaceleração maior do que a imaginada no segundo semestre do ano passado, tanto em função das medidas que o Banco Central havia adotado para esfriar a demanda quanto pelo agravamento da crise internacional. A demanda cresceu menos do que se esperava, o que levou as empresas a acumularem um volume de estoques maior do que desejariam. Esse processo é que está levando a produção industrial a reagir mais lentamente às medidas que vêm sendo adotadas pelo governo desde o segundo semestre de 2011. No entanto, em função das medidas adotadas mais recentemente, é possível esperar alguma retomada da produção industrial nos próximos períodos.
Há previsão de quando essa recuperação vai começar?
De fato se está enfrentando uma demora maior da indústria a responder a esses fatores. Mas medidas que foram tomadas no sentido de estimular a demanda por automóveis, por exemplo, já resultaram em aceleração das vendas em junho.
O governo está no caminho certo? Os pacotes são suficientes?
Medidas que procuram estimular demanda e consumo revertem um quadro de deterioração no curto prazo. Mas certamente elas não dão conta das questões mais estruturais ligadas à competitividade da produção nacional. Inicialmente se atribuía muito peso à taxa de câmbio, mas temos desde o ano passado uma depreciação de cerca de 25% a 30% da taxa de câmbio brasileira e, ainda assim, esses problemas continuam presentes, o que indica que temos de enfrentar questões mais estruturais. As medidas são corretas, mas não suficientes. É preciso avançar mais na questão da infraestrutura, logística, energia. A carga tributária funciona como uma trava à ampliação dos investimentos.
Ainda é possível evitar uma queda na indústria em 2012?
Me parece difícil. Ainda que se espere alguma recuperação da produção industrial no segundo semestre, certamente ela não vai acontecer no ritmo necessário para evitar uma queda no ano.
Podemos esperar nova redução de expectativas?
É bem provável. A economia passou por processo de desaceleração bastante acentuado no segundo semestre do ano passado, que deixou para 2012 um efeito de carregamento muito baixo. E no primeiro semestre não houve recuperação na intensidade esperada, por diversos motivos. Talvez porque o foco das medidas de estímulo tenha sido equivocado, muito centrado na questão do crédito num momento em que as famílias estão com grau de endividamento elevado. Talvez o foco devesse ter sido mais em medidas que estimulassem a oferta, o investimento, isto sim uma poderosa fonte de demanda para o setor industrial.
Essa retração pode se refletir no mercado de trabalho?
O mercado de trabalho não reagiu ainda a essa desaceleração da atividade, mas é bem provável que venhamos a observar aumento da taxa de desemprego no segundo semestre.