Título: Governo promete choque de investimento, mas alta é de só 2%
Autor: Otta, Lu Aiko
Fonte: O Estado de São Paulo, 05/07/2012, Economia, p. B5

Segundo a ONG Contas Abertas, a execução dos projetos no primeiro semestre consumiu R$ 18,9 bi, quase o mesmo valor de 2011

Mesmo com a ordem de dar um "choque de investimentos" e com cobranças duras da presidente Dilma Rousseff, os ministérios encerraram o primeiro semestre deste ano sem conseguir acelerar os empreendimentos sob sua responsabilidade. A execução dos projetos consumiu R$ 18,9 bilhões, valor apenas 2,2% maior do que o registrado em igual período de 2011 e 13,7% abaixo de 2010. Os dados foram levantados pela organização não governamental Contas Abertas.

"A crise nos investimentos públicos tem endereço: Esplanada dos Ministérios, bloco R", disse o secretário-geral da entidade, Gil Castello Branco. O bloco citado é onde funciona o Ministério dos Transportes, que concentra uma queda de R$ 2,5 bilhões nos investimentos. O mau desempenho anula os aumentos ocorridos em outras áreas, como Saúde e Educação.

Na segunda-feira, o Estado publicou reportagem mostrando que a área de transportes do governo ainda não se recuperou da "faxina" realizada um ano atrás, com a demissão da cúpula da pasta.

O diretor-geral do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), general Jorge Ernesto Pinto Fraxe, afirmou haver herdado "15 bilhões de problemas", referindo-se à carteira de contratos do órgão, de R$ 15 bilhões, onde há obras que passaram por até sete revisões de contrato.

E avisou: não são coisas que se resolvem facilmente.

O presidente da Valec, José Eduardo Saboia Castello Branco, tenta anular na Justiça a compra de trilhos ferroviários com sobrepreço de 30% a 40% e negocia com o Tribunal de Contas da União (TCU) uma solução para o fato de a estatal haver contratado, no passado, a construção de 12 fábricas de dormentes quando em tese seria necessário apenas uma, o que traz um prejuízo potencial da ordem de R$ 200 milhões.

De acordo com o levantamento da Contas Abertas, os investimentos da Valec estão, este ano, R$ 167 milhões inferiores aos de igual período de 2011. No Dnit, a queda registrada é de R$ 2,1 bilhões. Dessa forma, o Transportes lidera a queda dos investimentos neste ano, mas o desempenho é ruim também em outras áreas. O Ministério da Integração Nacional, responsável pela integração de bacias no São Francisco, registra queda de R$ 173 milhões nos investimentos. Nas Cidades, a retração é de R$ 128 milhões.

Eleições. É possível ver uma reação nos investimentos do governo em junho, em comparação com os demais meses de 2012. Os empenhos, que correspondem à reserva de uma verba para pagar determinado contrato e constituem a primeira etapa do gasto público, atingiram R$ 7 bilhões, ante R$ 2,3 bilhões do mês anterior. O número sugere que a realização de investimentos vai aumentar nos próximos meses.

Mais do que pelo efeito da ordem de Dilma de dar um "choque" na máquina pública, esse desempenho é explicado pela legislação eleitoral, segundo avaliou Gil Castello Branco.

A regra é que gastos novos só se iniciem até três meses antes do pleito, de forma que o prazo fatal é julho.

Os dados da Contas Abertas são diferentes dos que serão divulgados pela Secretaria do Tesouro Nacional no final deste mês.

O governo inclui os gastos do programa Minha Casa Minha Vida nos investimentos, embora no orçamento federal eles estejam classificados como custeio. A manobra contábil permite ao governo dizer que os investimentos estão em alta este ano, quando na verdade o desempenho é modesto.

No mês passado, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, criticou os analistas que condenam a inclusão do programa habitacional na conta dos investimentos. "Mas não somos nós que estamos excluindo o Minha Casa Minha Vida do cálculo", disse Castello Branco. "Usamos a classificação que o próprio governo usa no orçamento, ou seja, o Ministério da Fazenda é que precisa se entender com o Planejamento."