Título: Presidente egípcio desafia militares e restitui Legislativo de maioria islâmica
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Fonte: O Estado de São Paulo, 09/07/2012, Internacional, p. A10

O novo presidente do Egito, Mohamed Morsi, ordenou ontem que o Parlamento de maioria islâmica fosse reconvocado até a eleição de novos parlamentares, desafiando a autoridade dos generais que o dissolveram com base na decisão de um tribunal - sob a justificativa de irregularidades detectadas na eleição parlamentar realizada em várias etapas, de novembro a janeiro.

No dia 30, Morsi foi empossado pelos generais que estiveram no poder desde a queda de Hosni Mubarak no ano passado. Mas, pouco antes de entregar o poder, os militares limitaram alguns dos poderes presidenciais e conferiram a si mesmos um papel legislativo. A decisão do presidente remove os poderes legislativos do Exército e os devolve a um Parlamento dominado pelo partido de Morsi, a Irmandade Muçulmana, e seus aliados.

A agência estatal de notícias Mena disse que o conselho militar convocou ontem à noite uma reunião de emergência para debater o decreto. Um membro do conselho disse, sob a condição de anonimato, que os generais não tinham sido alertados antecipadamente da decisão tomada por Morsi.

O presidente convocou também a realização de eleições antecipadas depois que uma nova Constituição tenha sido redigida. Isso denotou uma possível concessão ao indicar que a Assembleia, criticada por alguns em decorrência de seu fraco desempenho inicial, não teria um mandato de quatro anos.

"O presidente Morsi ordenou a reconvocação do Parlamento eleito, que deverá manter suas sessões", afirmou um comunicado presidencial lido pelo assessor Yasser Ali. "Uma eleição parlamentar antecipada será realizada dentro de 60 dias após a aprovação de uma nova Constituição", disse Ali.

As reuniões de uma assembleia para a redação de uma nova Constituição ainda estão nos estágios iniciais, atrasadas pelas disputas entre liberais, islâmicos e outros. Analistas dizem que não esperavam um relacionamento tranquilo entre o Exército, laico, e um presidente islâmico, mas acreditavam que Morsi agiria com cautela para evitar um confronto.

"Todos esperavam que isso ocorresse, mas não agora, a não ser que essa decisão tenha sido tomada em conjunto com o conselho militar, algo que me parece difícil de acreditar", disse o analista político Mohamed Khalil a respeito do decreto de ontem.

"Isso significa que ele está tirando o Poder Legislativo do conselho militar e devolvendo-o ao Parlamento. Talvez ele precise de certas leis nesse período para garantir o poder do governo ou para implementar o plano de cem dias" para as primeiras semanas de presidência, disse Khalil. O contexto no qual a decisão foi tomada ainda não está claro, mas o pedido por eleições antecipadas pode aplacar a demanda por um novo Parlamento, disse ele.

"O Exército queria dissolver o Parlamento, mas a Irmandade reagiu. Deve haver algum ponto intermediário com o qual eles possam concordar, caso contrário haverá um impasse interminável e ambos os lados serão obrigados a fazer concessões", disse Shadi Hamid, do Brookings Doha Center. "Esse pode ser um acordo de concessões mútuas para o curto prazo, permitindo que o Exército tenha parte daquilo que quer - um novo Parlamento nos próximos meses - e serve para que os islâmicos evitem uma situação na qual os militares dominem a autoridade legislativa", disse. / REUTERS e NYT