Título: Medida boa, mas ocasional
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Fonte: O Estado de São Paulo, 11/07/2012, Notas e informações, p. A3

Boa para os contribuintes, a notícia de que o segundo lote de restituição do Imposto de Renda Pessoa Física de 2012 alcançou o valor recorde de R$ 2,6 bilhões e beneficia 2,46 milhões de declarantes seria ainda melhor se resultasse de uma mudança para ficar do relacionamento do governo com os cidadãos que recolhem impostos.

Trata-se, porém, de uma medida de emergência, entre as muitas que, assustado com a intensidade da desaceleração da atividade econômica, o governo vem experimentando no esforço para estimular o consumo e os investimentos privados. Causa estranheza o fato de ter sido tomada num momento em que são fortes os sinais de que a receita tributária está caindo. Dados preliminares indicam que a arrecadação de junho - cujos números finais serão anunciados depois do dia 20 - poderá ficar R$ 20 bilhões abaixo do previsto pelo governo.

Os contribuintes anseiam por dispor rapidamente do dinheiro a que têm direito por terem recolhido imposto a mais. A correção do valor devido pela Selic - no caso do novo lote, a correção será de 2,3% - evita perdas maiores para o contribuinte. Mas, se dispusesse do dinheiro tão logo a Receita concluísse a análise de sua declaração, ele poderia optar logo por uma destinação diferente para esses recursos - aquela que lhe fosse mais vantajosa.

Como parte da política fiscal do governo, no entanto, a Receita Federal tem feito as devoluções conforme a disponibilidade de caixa do Tesouro, em geral contendo o volume mensal de restituição até que tenha projeções mais precisas para o comportamento da arrecadação ao longo do ano. Agora, diante dos efeitos da crise, o governo age apressadamente para tentar agradar aos contribuintes e reduzir o impacto negativo da desaceleração econômica na vida das pessoas.

É expressivo o volume de dinheiro que o governo está devolvendo aos contribuintes. Somados, os valores restituídos em junho e julho - no lote deste mês estão incluídos resíduos de restituições de 2008 a 2011 - chegam a R$ 5,1 bilhões, ou 36% de tudo o que a Receita precisa devolver aos contribuintes até dezembro. Esse valor é 27,5% maior do que o devolvido nos meses de junho e julho do ano passado.

A expectativa do governo e do empresariado do comércio é de que uma parte do dinheiro - que estará disponível para os contribuintes a partir de segunda-feira, dia 16 - seja utilizada no consumo. Outra parte poderá ser empregada na quitação das dívidas vencidas, o que, se ocorrer, reduzirá a inadimplência - que tem alcançado índices recordes, de acordo com dados do Banco Central - e permitirá que os antigos inadimplentes voltem a comprar bens pelo crediário.

Certamente as restituições recordes anunciadas pela Receita produzirão algum estímulo nas vendas do comércio, mas juntam-se a outras já adotadas pelo governo e que, até agora, se mostraram insuficientes para evitar a desaceleração da economia. Entre outras medidas, o governo reduziu o IPI e os encargos trabalhistas para alguns setores, forçou os bancos públicos federais a reduzir bem mais do que as instituições privadas os juros de suas operações, transferiu mais recursos para o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social ampliar as linhas de financiamento à produção e aumentou a oferta de crédito para a agricultura.

Mas as projeções para o crescimento do PIB em 2012 estão diminuindo. Dentro do governo já se admite que o desempenho deste ano será pior do que o de 2011, quando o PIB acresceu 2,7%. Entre os empresários, o clima é de desalento, o que leva ao adiamento ou cancelamento de projetos de expansão. Para o governo, a desaceleração resultará em arrecadação menor do que a prevista.

O uso mais racional e produtivo dos recursos públicos, por meio do corte de despesas de custeio que permita a ampliação dos investimentos em infraestrutura, manteria a demanda interna e melhoraria as condições futuras para a produção, o que poderia estimular o setor privado a também investir. Mas o governo insiste em medidas pontuais, basicamente voltadas para o consumo.