Título: Dólar e consumo não são risco à inflação
Autor: Chiara, Márcia de
Fonte: O Estado de São Paulo, 07/07/2012, Economia, p. B3

Sem pressão do dólar e com as famílias no limite do endividamento, a inflação deve ficar estável no segundo semestre. A opinião é do economista-chefe da corretora Souza Barros, Clodoir Vieira. Em entrevista à TV Estadão, ele destaca que nem o recebimento do 13.º salário no fim do ano deve puxar os preços, já que as famílias acabam usando os recursos para pagar dívidas.

A seguir, os principais trechos da entrevista.

O grupo Transporte recuou 1,18% em junho e foi o grande destaque do IPCA. O que causou essa queda tão grande?

O que acontece é que tivemos uma redução do imposto (IPI) para carros novos. Com isso, as vendas aumentaram, mas o corte do imposto acabou diminuindo o custo final para o consumidor. Os carros usados, que tiveram uma queda um pouco maior, de 4,26%, também contribuíram para a queda da inflação. Ou seja, o IPCA agora está mais próximo da meta, como o governo gostaria que fosse.

As ofertas das montadoras e a queda do juro podem estimular muito o consumo e, com isso, pressionar a inflação?

Não acredito nisso. A demanda está desaquecendo, mesmo com a expectativa de mais corte de juro nas próximas reuniões do Copom. Tudo isso contribui para chegarmos à meta de inflação para 2012.

A inflação em 12 meses ficou em 4,92%, muito próximo da meta de 4,5%. Como está a expectativa para o segundo semestre? Há algum efeito sazonal que possa preocupar?

Nos próximos três meses, eu acredito que a inflação anual mantenha esse nível ou até recue mais. No fim do ano, costuma aquecer um pouco, mas não deve ser muito. As famílias já estão endividadas. Com o recebimento do 13.º salário, muitos vão usar o benefício para pagar dívidas. Não vejo perigo de explosão de consumo no fim do ano.

O dólar no patamar atual de R$ 2 tende a pressionar a inflação, com os importados ficando mais caros?

O dólar subiu relativamente bem este ano. Saiu de R$ 1,75 e passou a R$ 2. Eu acredito que para o fim do ano o dólar venha a cair um pouco. A Europa, que é a grande preocupação, acaba forçando a saída de dólares do País. O governo também tomou algumas medidas para forçar a moeda, mas acabou retirando. Acredito que o dólar fique abaixo de R$ 2, entre R$ 1,90 e R$ 1,95, para os próximos meses e para o fim do ano.

Até por causa do alto endividamento da população, as medidas que o governo tomou para estimular o consumo devem ser inócuas no curto prazo ou ainda terão algum efeito?

Sempre que o governo toma alguma medida, como a redução do IPI, tem alguns efeitos, mas eu acredito que bem menor do que o que aconteceu em 2008, 2009, quando as medidas deram um fôlego muito grande para as famílias. Ou seja, elas já se endividaram lá atrás. O endividamento não é ruim. Desde que você tenha capacidade de planejamento para pagar isso. O ruim é que no Brasil o spread bancário é muito alto. Em financiamentos de produtos, 60% do valor pago pelo consumidor pode representar juro. O ruim de se endividar é isso: a retirada do poder de compra das famílias.