Título: Com apoio de Lula e aval de colegas do STF, Toffoli vai julgar mensalão
Autor: Rosa, Vera ; Recondo, Felipe
Fonte: O Estado de São Paulo, 31/07/2012, Nacional, p. A4

Presidente da Corte, Ayres Britto afirma que, como ele já tomou decisões no processo, deve participar do julgamento

Mariângela Galucci

O ministro do Supremo Tribunal Federal José Antônio Dias Toffoli vai participar do julgamento do mensalão, que começa na quinta-feira, 2, e deve durar mais de um mês. Em conversas reservadas, Toffoli disse não ver motivos para se declarar impedido. Acrescentou que a pressão para ficar de fora só o estimulou a atuar no caso.

Amigo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, para quem também não há motivos de impedimento, e do ex-ministro da Casa Civil José Dirceu – apontado pelo Ministério Público como "chefe da quadrilha" do mensalão –, Toffoli construiu sua carreira jurídica dentro do PT. Ele foi advogado do partido – destacando-se na liderança petista na Câmara dos Deputados nos anos 1990, e na consultoria de campanhas eleitorais –, assessor jurídico da Casa Civil quando o ministro era Dirceu e advogado-geral da União do governo Lula.

Antes de assumir a cadeira no Supremo, Toffoli também atuou como advogado do próprio Dirceu em algumas ocasiões. Até 2009, ele era sócio no escritório da advogada Roberta Maria Rangel, hoje sua namorada, que defendeu outros acusados de envolvimento no mensalão, como os deputados Professor Luizinho (PT-SP), então líder do governo, e Paulo Rocha (PT-PA).

Indicado para assumir a presidência do Tribunal Superior Eleitoral em 2014, Toffoli se diz contrariado com as dúvidas lançadas sobre sua isenção – questionamentos são feitos desde que tomou posse no STF em 2009. "Eu já estou participando desse processo. Não vou sair de jeito nenhum", disse o ministro, segundo relato de um interlocutor.

Toffoli já analisou, por exemplo, recursos de advogados de defesa dos réus nessa fase anterior ao início do julgamento de fato.

Sinalização. O presidente do STF, Carlos Ayres Britto, afirmou na segunda-feira, 30, que a participação do colega na análise de questões relativas ao processo do mensalão indica que ele não vai se declarar impedido. "Não me compete opinar sobre nada, se ele vai ou se não vai (julgar o mensalão), e não quero ser mal interpretado. Agora, isso (participar de etapas anteriores) sinaliza participação. Sem dúvida", disse na segunda em Brasília o presidente do Supremo.

Não há pressão na Corte para que ele não julgue o caso. Nos bastidores, os comentários são de que o Supremo é movido "por espírito de corpo" e, portanto, outros integrantes da Corte, também com ligações políticas, poderiam ser alvos de suspeição e sofrer o mesmo constrangimento caso Toffoli fique fora.

Exemplos. Na tentativa de desqualificar a pressão sobre Toffoli, dirigentes petistas ressuscitaram a filiação de Ayres Britto ao PT nos anos 90. Lembraram, por exemplo, que ele foi candidato a deputado federal pelo PT de Sergipe, em 1990, e, na época, mantinha ótimo relacionamento com Dirceu. Hoje, o voto de Britto é computado pelo partido na lista dos contrários ao ex-ministro.

Para Marco Aurélio de Carvalho, coordenador jurídico do PT, há "incoerência" em relação à cobrança sobre a participação do ministro. "Os mesmos critérios levantados deveriam ser arguidos em relação ao ministro Ayres Britto", afirmou Carvalho.

Advogados ligados ao PT afirmam, ainda, que, se a pressão valesse para todos, a presença do ministro Gilmar Mendes, indicado ao Supremo pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, também poderia ser contestada, pois ele conversou sobre mensalão com Lula, testemunha no processo. A reunião ocorreu em abril, no escritório de Nelson Jobim, ex-titular da Defesa. Segundo relato de Mendes, o ex-presidente o teria presionado para adiar o julgamento. Lula nega.

Pedido. Sem ligação como processo, o advogado Paulo Magalhães Araújo, que comanda uma ONG, pediu ontem a suspeição de Toffoli em petição encaminhada ao Supremo. Como não é representante de nenhum dos réus do caso, o pedido deve ser ignorado pelos ministros.

No arquivo

A ministra do STF e presiden-te do TSE Cármen Lúcia arquivou pedido de advogados ligados ao PT para ponderar no STF sobre inconveniência de julgar o mensalão no período eleitoral. “Não cabe ao TSE”, disse ela.

Thomaz Bastos pede consulta a novo texto de procurador

Os advogados Márcio Thomaz Bastos e José Carlos Dias, que defendem réus do processo do mensalão, pediram para ter acesso ao texto entregue ao Supremo na semana passada pelo procurador-geral da República, Roberto Gurgel, no qual ele reafirma suas acusações contra os suspeitosde envolvimento no esquema.

No memorial entregue ao Supremo – uma espécie de resumo das acusações contra os 38 réus do processo do mensalão –, o procurador-geral afirma que o caso é o mais “ousado” esquema de corrupção já montado no País. Os advogados negam que o pedido possa adiar o início do julgamento, marcado para a quinta-feira. “Caso seja aceito pelo STF, o pedido de vista não ensejará qualquer tipo de adiamento do julgamento. O requerimento apenas reafirma uma prerrogativa da defesa de se pronunciar após a acusação, em atendimento aos princípios constitucionais da ampla defesa e do contraditório”, informou nota divulgada pelos defensores na tarde de ontem. Além de Thomaz Bastos e Dias, outros defensores protocolaram requerimentos ontem. Nenhum deles deverá ser capaz de adiar o início do julgamento, segundo avaliação de integrantes do Supremo Tribunal Federal. O julgamento do mensalão deverá durar um mês e meio. Deve acabar às vésperas das eleições municipais de outubro