Título: Uma carreira atrelada ao julgamento do mensalão
Autor: Sampaio, Dida
Fonte: O Estado de São Paulo, 02/08/2012, Nacional, p. A4

Acusador do mensalão, o cearense Roberto Monteiro Gurgel Santos, 57 anos, ingressou no Ministério Público Federal há 30 anos e fez a maior parte da sua carreira em Brasília, atuando em processos de natureza cível e eleitoral. Gurgel nunca foi apaixonado por assuntos criminais, tarefa que, em casa, tem na mulher, a subprocuradora-geral da República Cláudia Sampaio, uma das principais expoentes da instituição.

Há três anos à frente do MP, Gurgel já foi elogiado e criticado por petistas. Elogiado quando arquivou sem maiores investigações um pedido para abrir inquérito por enriquecimento ilícito contra o ex-ministro da Casa Civil Antonio Palocci. Criticado por ter segurado por três anos uma investigação que já revelava a relação do contraventor Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira, com o agora senador cassado Demóstenes Torres (ex-DEM, sem partido-GO).

Somente em março deste ano, após se tornarem públicas as relações dos dois, é que Gurgel pediu ao Supremo Tribunal Federal (STF) abertura de inquérito contra Demóstenes.

No meio do caminho, o procurador-geral acumulou vitórias importantes - a validade da Lei da Ficha Limpa para as eleições municipais deste ano, o reconhecimento da união homoafetiva e dos poderes do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) para investigar magistrados a qualquer momento. Outra vitória foi quando opinou a favor da tese de que a Lei da Anistia não permite reabrir casos da ditadura militar, pedido derrotado da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).

Maior teste. Em matéria criminal, mesmo não sendo sua área predileta, Gurgel ostenta no currículo o fato de ser o único procurador-geral da República que, desde a Constituição de 1988, condenou parlamentares. Foram cinco: José Gerardo (PMDB-CE); Natan Donadon (PMDB-RO); Tatico (PTB-GO); Asdrúbal Bentes (PMDB-PA) e Cássio Taniguchi (DEM-PR).

Mas, agora, Gurgel passará pelo principal teste. O chefe do Ministério Público trancafiou-se em casa durante o mês de julho para estudar o processo. Sem agenda pública, analisou o caso praticamente sozinho, segundo dizem os mais próximos.

Os ministros do STF gostam dele. "O Gurgel é uma voz de racionalidade na Procuradoria", costuma dizer Gilmar Mendes. Mas, reservadamente, alguns apontam falhas na instrução do processo herdado por Gurgel do antecessor Antonio Fernando de Souza - que protocolou a denúncia do mensalão no STF em 11 de abril de 2006. "Ele (Gurgel) podia ter feito novas diligências", afirmou um dos ministros. Essa fragilidade apontada pode facilitar, na avaliação de ministros, a absolvição de réus.

Se isso ocorrer, Gurgel pode entrar para a história como Aristides Junqueira, o procurador-geral que não conseguiu condenar no STF o ex-presidente Fernando Collor por falta de provas. "Os pedidos de produção de provas do Ministério Público e os da defesa só reforçaram a acusação inicial", afirmou a procuradora regional da República Raquel Branquinho, que atuou no caso. Caberá ao Supremo selar, além do destino dos mensaleiros, a marca de Gurgel.