Título: Marco Aurélio diz que Toffoli poderá constranger Corte
Autor: Sampaio, Dida
Fonte: O Estado de São Paulo, 02/08/2012, Nacional, p. A4

Ministro do Supremo levanta questões sobre participação de colega no caso do mensalão; procurador avalia colocar suspeição na pauta

O ministro do Supremo Tribunal Federal Marco Aurélio Mello afirmou ontem que, se a participação de José Antonio Dias Toffoli no julgamento do mensalão for questionada e o colega "insistir" em participar, será um constrangimento para ele próprio e para os colegas. O procurador-geral da República, Roberto Gurgel - que tem a prerrogativa de arguir a suspeição de um ministro, assim como os advogados -, avalia se vai ou não levantar a questão hoje.

A participação de Dias Toffoli no processo tornou-se uma das maiores polêmicas às vésperas da sessão inicial do julgamento.

O ministro, indicado pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 2009, foi advogado de campanhas presidenciais do PT, assessor jurídico da bancada do partido na Câmara dos Deputados e subchefe para assuntos jurídicos da Casa Civil quando o ministro era José Dirceu, um dos réus do mensalão. Além disso, a namorada de Toffoli, Roberta Rangel, foi advogada de acusados no processo.

Pelo regimento do Supremo, só o procurador-geral ou os defensores dos réus podem questionar a participação de Toffoli no caso. Se isso ocorrer, cabe ao plenário analisar a questão, caso o próprio ministro não decida deixar o processo.

Toffoli tem dado sinais de que vai participar do julgamento, como informou o Estado na terça-feira - ele não tem dado entrevistas sobre o assunto. Ontem mesmo, o ministro julgou duas questões de ordem apresentadas por advogados de réus do mensalão. Toffoli já havia votado em outros recursos e questões relativas à ação - em nenhum momento foi levantada a suspeição sobre o ministro.

'Própria carne'. Marco Aurélio disse que o STF só analisará o caso se for provocado e acha difícil que isso parta da própria Corte. "A rigor, poderia algum ministro (arguir a suspeição), mas é claro que há um problema ético muito grande, articular o impedimento de um par. É o que chamam de cortar na própria carne", afirmou. "Seria uma situação delicada, mas acima de tudo está meu dever como julgador."

O ministro defendeu que, se acusação ou defesa questionarem a participação de Toffoli, o Supremo tome uma decisão rápida sobre o assunto. "No caso concreto, penso que a decisão é imediata. A primeira medida é ouvi-lo (Toffoli), aí o procedimento oral impera", explicou. "Caso contrário, teria que suspender até o julgamento da ação penal, o que seria um incidente, impedimento ou suspeição."

Marco Aurélio citou seu próprio caso para ilustrar a questão. Em 1994, o ministro não votou nas ações contra o ex-presidente Fernando Collor de Mello, que o havia indicado ao Supremo e é seu primo de quarto grau - a lei veta grau de parentesco até o terceiro grau. "Por muito menos, não havia qualquer impedimento, qualquer dado concreto, e mesmo assim saí dos processos", disse o ministro. "Para o Supremo é um pouco triste ter que deliberar se o colega que insiste em participar do julgamento - já que pode haver, como ocorreu no meu caso, o afastamento espontâneo - está ou não impedido. E constrangimento também para ele próprio, se a decisão for positiva, ou seja, de que ele não pode participar", acrescentou Marco Aurélio em entrevista concedida ao Jornal Nacional, da TV Globo.

Congresso. Na volta do recesso parlamentar, o mensalão e a participação de Toffoli também foram lembrados no Congresso. Em discurso, o senador Pedro Taques (PDT-MT), ex-procurador da República, lembrou a "proximidade" do ministro com o "núcleo político do mensalão" e com José Dirceu. "Ele (Toffoli) não reúne condições mínimas para julgar com isenção." / COLABORARAM RICARDO BRITO e ROSA COSTA