Título: Efeito da redução do IPI na economia será cada vez menor
Autor: Silva, Cleide
Fonte: O Estado de São Paulo, 02/08/2012, Economia, p. B4

Incentivos tributários pontuais terão resultados cada vez menos expressivos no estímulo à economia, diz ex-ministro

As medidas setoriais de redução do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) terão impacto cada vez menor na economia, alerta o ex-ministro do Desenvolvimento e sócio da Barral MJorge Consultores Associados, Miguel Jorge. De setembro de 2011 a março deste ano, ele foi consultor da Associação Brasileira das Empresas Importadoras de Veículos Automotores (Abeiva).

Segundo Miguel Jorge, que integrava o governo quando houve a primeira redução do tributo, em 2008, a medida "não pode ser usada a toda hora". Ele também afirma que os incentivos pontuais deixam os consumidores confusos.

Na visão do ex-ministro, a indústria sofre, principalmente, de um problema estrutural em decorrência das décadas de forte protecionismo. A seguir, os principais trechos da entrevista.

O sr. estava no governo quando houve a redução de IPI, para estimular o consumo. Este ano, novamente, o governo buscou essa alternativa. Fazer alterações pontuais na tributação do imposto ainda é eficiente?

É eficiente, dependendo de por que você faz. Em 2008, quando foi realizada pela primeira vez essa redução de impostos, havia uma crise muito forte, que se estendeu até 2009. Então era necessária uma resposta rápida. Isso, aliado aos quase 30 milhões de novos consumidores que estavam saindo das classes D e E e indo para a classe C, fez com que houvesse uma manutenção dos níveis de consumo. Portanto, em um momento como esse, é bastante eficiente. Só que não pode ser usado a toda hora. Veio a segunda crise e nós fizemos a mesma coisa e os resultados já mostraram que os efeitos são menores.

E por que isso ocorre?

Porque as pessoas já compraram há três ou quatro anos, principalmente os primeiros consumidores, que não tinham televisão, máquina de lavar roupa e refrigerador. Nós precisaríamos ter um novo consumidor, o que não aconteceu nesse período. O efeito, portanto, é cada vez menor, porque é todo baseado no mercado interno.

Com esses estímulos temporários, o sr. considera que há uma instabilidade de regras no País?

Pois é, agora tem a discussão se vai ou não ser renovada a redução do IPI para automóveis. O consumidor pensa: "Não vai ser renovado, então vou comprar o carro". Depois repensa: "É possível que seja renovado, então vou adiar, assim compro em outubro em vez de agosto". As pessoas ficam confusas e a economia precisa ter estabilidade de regra. Só que nós precisaríamos fazer uma estabilidade com impostos menores. E já foi provado que isso aumenta o consumo e não traz prejuízo ao governo, pois a venda é muito maior e, portanto, arrecada-se mais.

Sondagem recente da CNI mostrou que o câmbio deixou de ser a principal preocupação dos industriais. Na opinião do sr.,esse é o grande responsável pelo fraco desempenho da indústria?

Eu não acredito. Nós temos um problema estrutural. Primeiro porque o setor foi protegido por muito tempo. Dos anos 1970 até 1990, era proibido importar tudo. Então foi uma indústria que não precisou se modernizar como as indústrias de outros lugares. Quando houve a abertura da economia, alguns setores se modernizaram muito, mas grande parte da nossa economia ficou menos competitiva por várias razões. Primeiro por essa zona de conforto e excesso de protecionismo. Segundo pelo custo Brasil (excesso de tributos e burocracia e infraestrutura precária), que faz com que nossa capacidade de produzir seja mais cara do que em outros países. Mas também porque estamos pouco afeitos à competição.

E podemos dizer que a indústria continua protegida no Brasil?

É um mercado ainda muito protegido. Em 2004, por exemplo, a indústria automobilística conseguiu do governo um prazo para colocar airbag no carro brasileiro em 2014. É incrível precisar de 10 anos para colocar airbag. Quando vieram os carros similares de outros países, já com airbag e ABS, aí nós fizemos uma proibição via aumento de imposto. E o resultado qual é? Protecionismo e zona de conforto.

Especialistas preveem que este ano está perdido para a indústria. O sr, concorda com isso?

Eu concordo, pois a indústria desacelerou muito. Tivemos um crescimento de PIB muito baixo no primeiro e no segundo trimestres do ano. Para chegarmos a 1,7% (de crescimento em 2012), que é a previsão dos analistas, teremos de ter expansão de 3% ou 4% no terceiro e no quarto trimestres, o que não será fácil.