Título: Jersey usa Maluf para mostrar que combate corrupção
Autor: Chade, Jamil
Fonte: O Estado de São Paulo, 18/07/2012, Nacional, p. A5
Ilha se defende de pressão de Obama; no 1 dia de julgamento, advogado de ex-prefeito desqualifica testemunhas de acusação
A defesa da empresa offshore Durant, ligada à família de Paulo Maluf, questionou ontem a veracidade dos testemunhos que acusam o ex-prefeito de desviar verbas de obras durante sua gestão em São Paulo (1993-1996) e enviá-las a paraísos fiscais. No primeiro dia do julgamento de Maluf em Jersey, o advogado David Steen- son questionou até a existência das testemunhas de acusação.
Hoje, no segundo e último dia de julgamento, a Justiça da ilha britânica do Canal da Mancha ouvirá os advogados ingleses contratados pela Prefeitura de São Paulo que tentam trazer de volta ao Brasil US$ 22 milhões que alegam ter sido desviados por Maluf. O juiz Howard Page não deve dar sua sentença já, porém.
A previsão é que ela seja divulgada nos próximos dias e ainda caberá recurso. O caso que tem Maluf como alvo é chamado pela imprensa da ilha no Canal da Mancha como "o maior processo civil da história do sistema legal de Jersey". Blindagem. O caso está sendo usado pelas autoridades locais como blindagem à ofensiva do presidente americano, Barack Obama, contra paraísos fiscais.
Uma iniciativa de 2008, liderada pelo então senador americano Obama, propunha duras sanções contra centros offshore que não cumprissem acordos internacionais para compartilhar informações sobre suspeitos de crimes financeiros. Jersey foi duramente cobrada e, desde 2011, utiliza o caso do político brasileiro para tentar aliviar a pressão.
O advogado de defesa da empresa Durant citou ontem várias vezes o nome do ex-prefeito, apesar de este negar manter contas no exterior. Em 150 minutos, David Steenson justificou a atuação de doleiros e até lembrou que o brasileiro foi "candidato a presidente".
A defesa insistiu que a Prefeitura não tem nenhuma prova de que as transações no exterior sejam frutos de corrupção, uma fnudança radical de estratégia em comparação à posição tradicionalmente adotada, de que as contas simplesmente não existiam. "Não existem evidências documentais. São apenas hipóteses", disse Steenson, que insistiu que os testemunhos de acusação seriam "forjados" - muitos depoimentos foram enviados por escrito para a ilha e outros dados por videoconferência.
O advogado da empresa ligada a Maluf questionou a ausência do promotor Silvio Marques, responsável pelo caso no Brasil, no julgamento em Jersey. Marques precisou mandar um e-mail à Corte de Jersey confirmando que as testemunhas não foram forjadas e são reais.
- Há também documentos segundo os quais o ex-prefeito e hoje deputado federal pelo PP recebeu subornos mesmo depois de ter deixado a prefeitura, em 1996. A acusação sustenta ainda que a empreiteira Mendes Júnior, uma das responsáveis pela construção da Avenida Águas Espraiadas (rebatizada mais tarde de Jornalista Roberto Marinho), emitiu notas fiscais com valores até dez vezes superiores ao custo de serviços prestados. Parte da denúncia é baseada no depoimento de Simeão Damasceno de Oliveira, ex-coordenador administrativo-fmanceiro da Mendes Júnior. Pelo depoimento, 10% do valor de algumas das notas de fato pagaria a obra. O restante seria distribuído para subornos, com um valor elevado indo para Maluf. A devolução era feita diretamente aos beneficiários do esquema ou a doleiros que enviavam o dinheiro para o exterior.
No dia 16 de abril de 1996, por exemplo, a Mendes Júnior emitiu um cheque de R$ 3,54 milhões em favor da Planicampo Terraplenagem. Nó dia 17, a Planicampo emitiu 22 cheques, num total de R$ 3,18 milhões, que teriam sido redistribuídos.