Título: Defesa cita Marco Aurélio e pede mínimo de prova
Autor: Macedo, Fausto ; Recondo, Felipe
Fonte: O Estado de São Paulo, 07/08/2012, Nacional, p. A6

Após ministro dizer ao "Estado" ser difícil obter confissão em casos de corrupção, advogados afirmam que dúvida deve beneficiar réu

Enquanto fazia sustentação oral no Plenário do Supremo Tribunal Federal em defesa do ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares, o criminalista Arnaldo Malheiros Filho voltou-se para o ministro Marco Aurélio Mello e disse: "Eu não quero uma escritura pública, eu não quero uma confissão, mas o mínimo de prova tem que haver".

Malheiros estava se referindo à entrevista do ministro publicada ontem pelo Estado na qual Marco Aurélio declarou que, para a condenação de acusados por corrupção, como o ex-ministro José Dirceu, não há necessidade de prova cabal.

"O que é que vai querer em termos de provas (de corrupção)? Uma carta? Confissão espontânea? É muito difícil você ter uma confissão espontânea. Você tem confissão espontânea de ladrão de galinha. Agora, do traficante ou de um delito mais grave, não tem. Só se partir para a escritura pública", disse Marco Aurélio.

"Os ministros têm as opiniões deles. Eu quero ver essas opiniões traduzidas em decisões nos autos", disse outro criminalista, Luiz Fernando Pacheco, que defende o ex-presidente do PT, José Genoino.

O jurista Christiano Santos, doutor em direito penal da PUC-SP, disse que, mesmo sem ato de ofício, já se caracteriza o crime de corrupção. Ele destaca, porém, que não há jurisprudência definida. "Para qualquer condenação é preciso comprovação dos fatos. Agora, o crime de corrupção é formal, porque não exige a produção de resultado material, ou seja, que se pratique ou não o ato de ofício depois", explicou. "O crime já está cometido ao oferecer, solicitar ou receber vantagem."

Para outros juristas, as declarações de Marco Aurélio soam como antecipação de voto, o que poderia abrir caminho para arguição de seu impedimento nos autos do mensalão. "Ele (Marco Aurélio) não deveria ficar falando durante o julgamento, falando inclusive no mérito, porque a manifestação foi de mérito", observou o advogado Luiz Flávio Gomes, juiz aposentado. Para ele, o ministro descumpriu a Lei Orgânica da Magistratura, que proíbe magistrado de comentar o caso que vai julgar. "Corre o risco de ser impugnado como parcial", afirmou.

"Um ministro não pode falar exatamente sobre aquilo que é objeto principal na área criminal, o exame da prova.", disse o jurista Walter Fanganiello Maierovitch. "Ao falar da prova cabal, o ministro caiu na impossibilidade de votar, de alguma forma ele antecipou alguma coisa fora de hora."

Espírito. O criminalista Antônio Cláudio Mariz de Oliveira, que defende a executiva Ayanna Tenório, do Banco Rural, avalia que o juiz deve absolver quando tem dúvidas. "A questão é essa. Se houver dúvida do julgador, ele tem que absolver. Não pode condenar ninguém na dúvida", afirmou. "Prova cabal é a prova que não pode deixar dúvidas no espírito do julgador. Se tem certeza, condena; se não tem, absolve."

O criminalista Alberto Zacharias Toron, que defende o deputado João Paulo Cunha (PT-SP) no processo do mensalão, considera que não há motivos para arguir impedimento de Marco Aurélio. "Vejo o comentário dele como uma questão doutrinária e jurisprudencial, em tese. Li a declaração dele como a expressão do entendimento de que, em certos casos, bastam indícios para condenar, desde que concatenados, convergentes e não contrariados por outro indício."/ COLABOROU FELIPE FRAZÃO