Título: Governo pode ter de gastar R$ 4 bi por ano para concessão de ferrovias vingar
Autor: Warth, Anne
Fonte: O Estado de São Paulo, 06/09/2012, Economia, p. B6

Novo modelo para o setor prevê que Valec comprará toda a capacidade das novas linhas; se não houver demanda, Estado vai bancar 100%

No início do funcionamento do novo sistema de concessões de ferrovias, o Tesouro Nacional pode ter de desembolsar até R$ 4 bilhões ao ano, segundo admitiu o presidente da estatal Valec, José Eduardo Castello Branco, em entrevista à "Agência Estado".

O modelo anunciado no mês passado prevê que a Valec comprará 100% da capacidade de transporte de carga das novas linhas férreas e as revenderá a empresas interessadas em transportar mercadorias ou pessoas em trens. Assim, se não houver interessados, o gasto ficará na conta do governo.

O risco de prejuízo, principalmente no início da operação das novas linhas, é abertamente admitido pelo governo porque não há, no País, uma grande quantidade de empresas operadoras de carga por trem.

"A Valec vai vender capacidade, mas vai vender para quem? Precisa ter um mercado que adquira essa capacidade. Então, é importante que esse mercado seja estimulado a existir", afirmou.

"Não há, diferentemente da área rodoviária, um mercado consolidado de transportadores ferroviários. Só existem aqueles que já atuam nas concessões de hoje, que devem ser fortes candidatos a se tornar futuros operadores em locais onde ainda não atuam", afirmou.

Para evitar sobrecarga ao Tesouro, estão em discussão medidas para estimular a formação de um mercado de operadoras de carga. O modelo ainda não está definido, disse o presidente da Valec.

"É uma coisa que está em estudo. Não há ainda nenhuma definição precisa sobre esse ponto, mas, como o assunto envolve muitas frentes de atuação, esse é um assunto que vai merecer atenção especial", afirmou. "Vai ter de ter incentivo fiscal, IPI reduzido, algo do gênero. Vai ter de ter alguns mecanismos para esse mercado", prevê.

Capacidade. O cálculo do potencial de prejuízo ao Tesouro toma como base os R$ 91 bilhões em investimentos previstos para construir e manter os 10.000 quilômetros de ferrovias a serem concedidos à iniciativa privada, pelo prazo de 25 anos. Dividindo-se o montante a ser investido pelo prazo da concessão, a cifra é de aproximadamente R$ 4 bilhões por ano.

"Se o governo não vender capacidade nenhuma, vai gastar todo ano R$ 4 bilhões", explicou Castello Branco. "Se vender R$ 1 bilhão em capacidade, o Tesouro só precisará aportar R$ 3 bilhões." O governo garante, porém, que as linhas terão demanda de usuários, pois vão passar por áreas de escoamento de produção de grãos e minérios.

"Temos de otimizar essa venda de capacidade para não ficar tudo nas costas do Tesouro. Claro que o governo não quer ter lucro com isso. Se der diferença para menos, o Tesouro cobre. Mas não podemos descuidar dessa questão. É preciso que tenhamos uma política comercial agressiva."

Construtoras interessadas. Se ainda não existem operadores, as novas ferrovias já atraem o interesse de algumas construtoras. Castello Branco afirmou que empreiteiras como Andrade Gutierrez, Galvão Engenharia, Camargo Corrêa e Queiroz Galvão, que possuem contratos com a Valec, já manifestaram interesse nos novos projetos apresentados.

"A maioria delas demonstra interesse nesse novo modelo", garantiu. Ele acredita ainda que os empreendimentos serão alvo também de construtoras internacionais.

"Diante desse cardápio de investimentos tão vasto, é possível que essas construtoras internacionais, por causa das dificuldades nos Estados Unidos e na Europa, venham a desembarcar aqui no Brasil. É a expectativa que temos."