Título: Dilma diverge de líder americano
Autor: Nossa, Leonencio
Fonte: O Estado de São Paulo, 26/09/2012, Internacional, p. A14

Presidente brasileira critica possível intervenção militar no Oriente Médio

A presidente Dilma Rousseff apresentou na manhã de ontem divergências acentuadas em relação ao discurso do presidente dos EUA, Barack Obama. Ao abrir a 67.ª Assembleia-Geral da Organização das Nações Unidas, ela apontou "ilegalidade" nas coalizões lideradas pelo governo americano sem participação do Conselho de Segurança da ONU e no apoio logístico e militar à oposição na Síria.

"Não há solução militar para a crise na Síria. A diplomacia e o diálogo são, não só a melhor, mas a única opção", afirmou. "O uso da força sem autorização do Conselho de Segurança é uma ilegalidade clara que vem ganhando ares de opção aceitável." No discurso de 24 minutos, ela avaliou que o Conselho de Segurança da ONU acompanha "imóvel" as intervenções dos EUA no Oriente Médio. "Não podemos permitir que esse conselho seja substituído, como vem ocorrendo, por coalizões que se formam à sua revelia, fora de seu controle e à margem do direito internacional."

Dilma afirmou que o mundo assiste "consternado" à evolução da "gravíssima" situação da Síria e a atacou o regime de Bashar Assad. "O Brasil condena, nos mais fortes termos, a violência que continua a ceifar vidas nesse país. A Síria produz um drama humanitário de grandes proporções", disse. "Recai sobre o governo de Damasco a maior parte da responsabilidade pelo ciclo de violência que tem vitimado o grande número de civis, sobretudo mulheres, crianças e jovens", completou. "Mas, sabemos também da responsabilidade das oposições armadas, especialmente daquelas que contam crescentemente com apoio militar e logístico estrangeiro."

Dilma expôs sua posição contra intervenções dos EUA no Oriente Médio. E reiterou que ações extremistas não justificam preconceito contra a comunidade islâmica. "Como presidente de um país no qual vivem milhares e milhares de brasileiros de confissão islâmica, registro nesse plenário nosso mais veemente repúdio à escalada de preconceito islamofóbico em países ocidentais." A presidente lamentou a morte do embaixador dos EUA Christopher Stevens e três diplomatas em Benghazi. "Com a mesma veemência repudiamos os atos de terrorismo que vitimaram diplomatas americanos na Líbia", disse.

O discurso de Dilma sobre o Oriente Médio não alterou as posições dos membros influentes da ONU, mas agitou a plateia. O pronunciamento da presidente em relação à Síria arrancou aplausos em dois momentos. Ela também foi aplaudida, pela terceira vez, ao defender um assento da Palestina como membro pleno da ONU.

Uma parte do plenário ensaiou uma quarta rodada de aplausos quando a presidente citou a "imobilidade" do Conselho de Segurança da ONU diante de intervenções militares de países desenvolvidos em áreas de conflito.

As críticas de Dilma à política internacional americana evitaram que o discurso passasse despercebido. Diplomatas da ONU não demonstraram tanta atenção quando ela abordou a crise econômica, um programa de redução de violência no trânsito, o desmatamento na Amazônia, o embargo comercial enfrentado por Cuba e melhorias sociais no Mercosul e decidiu promover os Jogos Olímpicos de 2016 e a Copa do Mundo de 2014.

Depois do discurso e dos cumprimentos do secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, Dilma se juntou na plateia à bancada brasileira. Ao lado de Marco Aurélio Garcia, assessor especial, e do ministro de Relações Exteriores, Antonio Patriota, ela acompanhou todo o discurso de Obama. Após o almoço, em conversa com jornalistas, ela minimizou as divergências de discursos. "E daí?", perguntou. "Cada um tem direito a ter uma posição. Ele tem a dele. Eu tenho a minha."